domingo, 5 de abril de 2009

Fernando Pessoa sobre a I República e Salazar

A editora Angelus Novus publicou por estes dias o volume «Contra Salazar», que reúne a prosa e a poesia de Fernando Pessoa a criticar o fundador do Estado Novo. Convém esclarecer a matéria. O apanhado compõe-se sobretudo de poemas menores, com erros estilísticos e de construção, daqueles que o poeta gatafunhava à mesa do Martinho - sem dar aos mesmos a importância que os vindouros agora lhes atribuem. Falemos claro. Pessoa criticava Salazar porque estava bem mais à direita do que o estadista. O poeta foi sempre um adepto das soluções de força. Esteve com a ditadura do general Pimenta de Castro, apoiou Sidónio Pais, entusiasmou-se com o modernismo fascizante, aplaudiu a revolução de Maio. Se criticava Salazar é porque este lhe sabia a pouco. Não lhe bastava viver habitualmente; queria viver intensamente - perigosamente até. A vida passa a correr para alguns bardos de mão cheia. O último acto público em que esteve presente, antes de ser internado para morrer no Hospital de S. Luís dos Franceses, foi um jantar de nacionais-sindicalistas. É importante esclarecer estes assuntos não vá a inteligência lusa empareceirá-lo com o Bento Gonçalves e o José de Sousa na resistência ao fascismo. (Já não digo com o Júlio Fogaça, que esse tinha pelo menos um rabo de palha.)

Se este volumezinho alcança justificação com o aniversário de Salazar, sugiro à novel editora - que até já tem a mão na massa, isto é, na obra do Pessoa - que abrilhante em 2010 o centenário da República com a edição de mais textos pessoanos. Deixo aqui um cheirinho do que seria o precioso volume. A palavra ao talassa:

"Bandidos da pior espécie [...], gatunos com seu quanto de ideal verdadeiro, anarquistas-natos com grandes patriotismos íntimos - de tudo isto vimos na açorda falsa que se seguiu à implantação do regime".

"Vem o Sr. Afonso Costa... Aquilo é que é uma besta!"


"Não podendo [Afonso Costa] fazer mais nada, é homem para mandar assassinar. Tudo depende do seu grau de indignação".


"Bernardino Machado, no discurso do Porto, mostra-se tão ignorante de como se é subtil, tão brutamontes no cá-estou-eu, tão labrego no insinuar, tão indecentemente saracoteador da sua candidatura, que qualquer meio-juízo compreenderia o que de anti-diplomático, não-frio e nada-esperto aquele espírito é".


"Mas Costa! Este é um piolho da [...] política [...] Era possível odiar Franco. A este esfregão nem isso é possível".


"Franco seria um tirano de merda; este [Afonso Costa] é um tirano de caca."


"Afonso Costa é um dos maiores bandidos que têm aparecido à superfície da política lusitana."


"Alexandre Braga é um aborto de um imaginativo conservado em álcool."


"Esta opressão, que todos nós sentimos, esta vergonha de estarmos sendo governados por bacalhoeiros da política, que roubam no peso da própria retórica [...]"


"[...] este domínio de carbonários e de ladrões, de arruaceiros e de gatunos, que lá vai para cinco anos nos conturba."


"[...] partidos políticos: eles não são mais que aquelas «quadrilhas de ladrões» de que José Dias Ferreira falava."


"[...] a estrangeirada atitude a que estes bandalhos da República chamam «patriotismo»."


Do blog Nova Frente, 30.3.2009