sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015


Petição Pública de apoio aos patriotas ucranianos



Apoio à reabilitação de militares ucranianos

Para: Ex.ma Senhora Presidente da Assembleia da República,


Ex.ma Senhora Presidente da Assembleia da República,

Os subscritores do presente Manifesto dirigem o seu apelo ao Estado Português para que subsidie os tratamentos e a reabilitação de alguns militares e combatentes-voluntários do exército ucraniano feridos no conflito armado na Ucrânia, em hospitais públicos ou privados em Portugal, em número e de acordo com as possibilidades existentes.

Estes militares, muitos de forma voluntária, arriscaram as suas vidas e à custa da sua saúde não só defendiam a integridade do seu país mas também contribuíam para que o conflito armado não se alastrasse para o resto do território da Ucrânia, não chegasse mesmo às portas da União Europeia, conseguindo evitar deslocações de refugiados para países da mesma. Eles estão a travar a luta para reestabelecer a paz na Europa.

Os peticionários têm conhecimento através das declarações das instituições governamentais ucranianas à comunicação social que 15 países recebem militares ucranianos para os tratamentos e a reabilitação. De acordo com os dados de Dezembro de 2014, setenta e três combatentes recebiam os tratamentos na Polónia, onze em Israel, oito na Croácia, quatro na Eslováquia, cinco no Reino Unido, treze na Letónia, quatro nos Estados Unidos da América, cinco na Alemanha. Vários países oferecem medicamentos e equipamento médico, deslocam os seus profissionais de saúde à Ucrânia para prestar apoio, avaliação e realização de cirurgias.

Os ucranianos valorizam o bom acolhimento que receberam em Portugal desde sempre, e agradeceram a ajuda que lhes foi dada com a sua integração, o seu conhecimento, o seu bom empenho e trabalho para o bem do país para onde vieram viver, assim foram estabelecidos laços bem fortes entre as duas nações. Esperamos que o Estado Português apoie a Ucrânia nesta altura tão difícil.

Por tudo isto os peticionários consideram essencial a colaboração e a ajuda de Portugal no tratamento e reabilitação dos militares feridos.

Agradecendo antecipadamente a atenção de V. Exa., apresentamos os nossos melhores cumprimentos.


Primeiros peticionários:

Iuliia Voroshylova (investigadora científica, Grupo de jovens ucranianos em Portugal «Synytsia»), Vasyl Bundzyak (padre ortodoxo de patriarcado de Kyiv, Braga), Pavlo Sadokha (Presidente da Associação dos Ucranianos em Portugal), Andriy Veber (Presidente da Delegação de Vila Nova de Gaia da Associação dos Ucranianos em Portugal), Nuno Miguel Trindade Lourenço (advogado, Alenquer), Tetiana Franchuk (Grupo de jovens ucranianos em Portugal «Synytsia»), Olena Nesterenko Afonso (professora de línguas, Coimbra), Svitlana Oksyuta (professora de música, Porto), Galyna Ilyuk (professora de música, Santo Tirso), Olena Dvoininova (Directora da escola ucraniana Cirilo-Metódio em Braga, doutorada em História)






quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015


Idiossincrasias


Helena Matos

Como não há revolução sem o culto das idiossincrasias dos revolucionários estamos agora na questão das gravatas. Ou mais precisamente do sem gravata. Em Portugal nos idos de 75 era o sem sono.

A tara das gravatas. Não falha: mal a esquerda aparece com um despreparado candidato a caudilho começa o engraçadismo sobre a sua forma de vestir, os seus gostos ou outras idiossincrasias. No caso do actual governo grego é a mania das gravatas ou mais propriamente a mania de não as usar. Em Portugal nos idos de 75 era o sono. Não havia jornalista, activista ou adepto do turismo revolucionário que após fotografar umas ceifeiras numa cooperativa no Alentejo, uma empresa ocupada na margem sul, ver duas manifestações em Lisboa e falar com três militares não manifestasse uma profunda admiração sobre os homens sem sono que dirigiam Portugal. Portugal era governado por homens sem sono e esse aparente detalhe, por estranho que possa parecer, fazia toda a diferença face aos rotineiros ensonados que governavam a restante Europa.

Aquele estado de reunião permanente do Conselho de Ministros e do Conselho da Revolução, sem esquecer as assembleias do MFA, era visto como um frenesi revolucionário a que as fardas e o cabelo comprido dos militares emprestavam um negligé viril que ficava particularmente bem nas fotografias e filmagens a preto e branco. Quanto mais instalados nas suas muito capitalistas e confortáveis vidas, mais estes ilustres visitantes achavam interessante esta insone experiência revolucionária, logo ali a poucas horas de avião de qualquer descansada e bem dormida capital burguesa.

Que os homens sem sono aprovassem em Portugal a mais desvairada e contraditória legislação, que muito do decidido fosse logo esquecido e ultrapassado por outras decisões, que se aprovassem medidas atentatórias dos direitos mais básicos, como o Tribunal Militar Revolucionário e o confisco dos bens, não lhes causava inquietação de maior. O que salientavam como extraordinária mais-valia deste nosso país era o facto de sermos governados por homens sem sono.

Desfeito o PREC, os governantes portugueses para seu e nosso bem voltaram a dormir como os demais. E a imaginária revolucionária deslocalizou-se para paragens mais remotas: tivemos o carapuço do comandante Marcos no México, os inevitáveis lenços palestinianos, o (que Camões e Dom Afonso de Albuquerque me perdoem a apropriação da palavra!) «terribil» fato de treino de Chávez e, numa aparente contradição, mas só aparente, porque nesta matéria o que conta é épater le bourgeois, o deslumbramento dos socialistas portugueses pela pose dum seu líder que comprava fatos numa loja de Rodeo Drive.

Em 2015 muitos cidadãos europeus deslocam as suas nunca desfeitas ilusões revolucionárias para a Grécia. E como não há revolução sem o culto das idiossincrasias dos revolucionários estamos agora na questão das gravatas. Como se a questão fosse Tsipras ou Varoufakis usarem ou não gravata. (Já agora parabéns a Renzi que aproveitou o encontro com Tsipras para fazer publicidade a um dos produtos símbolo do sucesso da marca Itália: as gravatas). O problema do governo grego é que a única ideia que tem para governar a Grécia é pedir, mendigar, exigir, reivindicar e fazer palhaçadas de modo a sacar mais dinheiro aos outros. As gravatas, ou no caso concreto a ausência delas, é apenas um acessório da performance da pedincha disfarçada de bravata revolucionária. Pelo jeito com que a coisa vai os governantes gregos acabarão em Moscovo. Mas tanto quanto se sabe, na hora de cobrar as contrapartidas o Kremlin não costuma ser muito sensível ao vestuário dos seus tutelados. (Alguns aliás nunca mais precisaram de roupa na vida.) Talvez se Varoufakis for de túnica e sandálias como os pretéritos gregos seja bem-sucedido. Tem é de esperar pelo Verão.

O síndroma da mãe do Dantas. «Nós sentimos que a política que é hoje dominante na Europa está a matar a confiança dos nossos cidadãos pelo projecto europeu» afirmou António Costa. Não há dia em que os dirigentes do PS português, do PSOE espanhol, a par de outros líderes do socialismo democrático europeu não afiancem que a austeridade está a matar, que já não há líderes e que estamos à beira do caos. A austeridade está de facto a matar. Mas não é o projecto europeu mas sim uma ideologia. Mais precisamente a austeridade está a matar o socialismo democrático cujos partidos se arriscam a desaparecer do mapa eleitoral na Grécia, Espanha e França. E em boa parte isto acontece porque os líderes socialistas nos momentos difíceis ficam atacados pelo síndroma da mãe do Dantas.

Júlio Dantas que a maior parte lembrará por causa do manifesto que Almada lhe dedicou (por sinal, Júlio Dantas era uma figura bem mais complexa e corajosa do que aquilo que Almada sugere, mas esse assunto ficará para outra crónica). Ora entre os traços de personalidade de Júlio Dantas contava-se a absoluta desmesura com que vivia os factos da sua vida. Era um dramático, como então se dizia, para não entrar em maiores e à época embaraçosos detalhes.

Este traço de personalidade do nosso Dantas esteve à beira de deitar por terra um acontecimento em que várias personalidades portuguesas tinham posto muitas das suas maiores expectativas e vaidades: uma embaixada cultural que ia ao Brasil participar nas cerimónias evocativas do descobrimento daquele território (agora deve dizer-se achamento mas à época achar era próprio dos tolos). Ter conseguido constituir aquela «embaixada cultural» custara laboriosas negociações com Salazar que, para lá das proverbiais questões de dinheiro, temia a forma festiva para não dizer carnavalesca como no «país irmão» se tratavam os venerandos factos da História. No limite e sob o espectro de, por ausência de Portugal, Pedro Álvares Cabral acabar a ser representado com plumas e outros luzentes adereços, lá seguiu a embaixada cultural para o Brasil. Presidia-a Júlio Dantas. Ora a meio da viagem chegou a informação de que tinha morrido a mãe de Júlio Dantas.

Foram imensas a dor e a consternação que se abateram sobre o extremoso filho. Mas não só: a partir do momento em que a bordo se soube do passamento da senhora, Júlio Dantas comportou-se como se todos os membros da embaixada, a tripulação do navio e o próprio oceano estivessem de luto pela sua finada mãe. Mas mesmo assim não lhe chegava. Para o Brasil foi comunicado que falecera a mãe do dr. Júlio Dantas. Solícitos, os brasileiros logo acharam que também eles se deviam associar ao luto que naquela fase já não era do dr. Júlio Dantas mas de toda a delegação portuguesa. E assim, entre a exorbitação de Júlio Dantas e a atracção dos brasileiros pela espectacularidade, seja ela da vida ou da morte, as manifestações de dó pela morte da mãe do Dantas iam num crescendo arrebatador.

A bordo, os portugueses já se viam afastados de todas as cerimónias (as tais para as quais tinham andado durante meses a preparar vénias e discursos!) e a serem recebidos não como convidados de honra nas comemorações da descoberta do Brasil mas sim para naquela terra bendita chorarem a mãe do Dantas. E é quando os brasileiros, empolgados com a dor do Dantas, já comunicam para bordo a sua intenção de receber os portugueses com missas solenes e Te Deum que na embaixada portuguesa alguém declara que quem morrera fora a mãe do Dantas não a mãe da Pátria. Logo o Dantas que fizesse o seu luto enquanto a embaixada iria tratar daquilo a que se propunha: comemorar a descoberta do Brasil.

Os socialistas estão exactamente como o Dantas naquele barco a caminho do Brasil: acham que a Europa está à beira do fim, que os europeus deambulam sem líderes nem rota e que há que refundar tudo de novo. Ora o que os eleitores lhes estão a dizer é que quem está a morrer não são as restantes ideologias mas sim o socialismo democrático. Só que ao contrário da mãe do Dantas que morreu de causas naturais, o socialismo democrático está a morrer por culpa dos seus líderes. Estes continuam a fazer programas e discursos como se estivéssemos no tempo em que a diferenciação dos partidos se fazia pelas diferentes formas como se propunham distribuir a riqueza.

Impossibilitados de recorrer aos truques e à demagogia da esquerda e da direita radicais, os socialistas acabam por falta de propostas adequadas ao tempo em que vivemos a não capitalizar o descontentamento dos eleitores do centro: Passos, Rajoy e até o grego Samaras perdem eleitores mas mantêm os seus partidos como alternativas de poder.

À força de quererem identificar o seu problema ideológico com o fim das ideologias, obstinados em falar do tempo passado em que gostaram de viver e foram líderes, os socialistas ficaram sem discurso sobre os tempos em que vivemos. E deixaram não só que esse espaço fosse ocupado pelos radicais como que os defensores da austeridade aspirem a ganhar as eleições ou a não as perder por muito.

Ou os dirigentes socialistas percebem que quem está com problemas é o socialismo democrático e actualizam o seu discurso, ou arriscam-se a que muitos eleitores lhes deem a correr os pêsames e os deixem sós na sua missa por alma do passado antes de irem participar na festa dos outros.





segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015


A guerra do Islão


José António SaraivaJornal Sol, 26 de Janeiro de 2015

Depois dos atentados em Paris, o primeiro-ministro francês, Manuel Valls, e a chanceler alemã, Angela Merkel, fizeram uma declaração solene: «A luta é contra o terrorismo, não é contra o Islão».

O pior inimigo dos muçulmanos que hoje vivem na Europa é a inacção dos Governos nacionais – permitindo uma liberdade de acção aos fundamentalistas que acaba por virar a opinião pública contra toda a comunidade islâmica

A intenção era óbvia: tentar precaver acções racistas contra os muçulmanos – e, ao mesmo tempo, acalmar os países islâmicos amigos.

Mas dizer isto é tentar tapar o sol com a peneira.

Porque este tipo de terrorismo é indissociável do Islão.

Os terrorismos não são todos iguais – e o terrorismo islâmico tem características próprias, sendo completamente diferente dos terrorismos que conhecemos na Europa.

As organizações terroristas europeias das últimas décadas – o Baader-Meinhof na Alemanha, as Brigadas Vermelhas em Itália, o Sinn Fein na Irlanda, a ETA no País Basco, as FP-25 em Portugal – actuavam geograficamente e tinham objectivos políticos concretos.

O terrorismo islâmico, pelo contrário, não é localizado geograficamente – está disseminado por todo o planeta – e não tem um objectivo político determinado – visa atingir a civilização Ocidental no seu conjunto.

Há quem, como Ana Gomes, tente explicar o terrorismo islâmico com base nas más condições de vida ou numa deficiente integração dos muçulmanos nos países de imigração.

Ora, dizer isto é não compreender o fenómeno.

Se as condições de vida produzissem terroristas, já teríamos visto muitos pobres em Portugal, atingidos pela austeridade, pegarem em metralhadoras e irem por aí fora a matar pessoas.

E se fosse pela deficiente integração, muitos africanos em Portugal já se teriam transformado em homens-bomba.

As condições de vida e o desenraizamento podem facilitar o recrutamento de operacionais, mas a raiz do terrorismo islâmico é outra.

E se fosse esta também não teria solução, pois a Europa não vai sair da crise tão cedo e a integração dos muçulmanos nas sociedades europeias nunca será completa...

Como se vê em França, na Bélgica, em Inglaterra ou na Alemanha, as populações de origem árabe, por exemplo, conservam em geral os seus hábitos de vida: comem a sua comida, vestem à sua maneira, professam a sua religião, lêem os seus jornais, vivem nos seus bairros.

E depois, em virtude de serem cada vez mais associados ao terrorismo, os muçulmanos são olhados com desconfiança pelo resto da população – o que agrava a segregação.

Perante um muçulmano, as pessoas hoje pensam: quem sabe se por detrás deste homem não se esconde um terrorista?

Ao contrário de outros terrorismos, o terrorismo islâmico é de natureza religiosa – embora haja dificuldade em aceitar esta ideia, porque a cartilha marxista, que continua a condicionar o pensamento de muita gente, contempla sobretudo as condições socio-económicas.

Mas basta olhar para a História para o perceber: a guerra entre o Islão e o Ocidente cristão vem de muito longe (e nós sabemos isso melhor do que ninguém, pois ajudámos a expulsar os «infiéis» da Península).

Sucede que, ao contrário do cristianismo, o islamismo conservou uma vertente fundamentalista e violenta, bem expressa nas atrocidades de Khomeyni, de Bin Laden ou do Estado Islâmico.

E o fundamentalismo não tem parado de crescer nos últimos tempos – conquistando cada vez mais terreno no Norte de África e multiplicando os atentados terroristas pelo mundo fora.

Neste momento, a Europa é um paraíso para os terroristas islâmicos, pela ausência de fronteiras nacionais, pela liberdade de movimentos, pela liberdade de propaganda, etc.

Em nenhuma parte do mundo existem tais condições.

Ora isto pode fazer do continente europeu, nos tempos que aí vêm, um palco privilegiado para os ataques terroristas.

Até porque aqui vivem 50 milhões de muçulmanos, possibilitando que eles se escondam com tremenda facilidade (procurar um muçulmano em certos países da Europa é como procurar agulha em palheiro) e oferecendo um campo de recrutamento  muito grande.

Enfrentar o terrorismo islâmico na Europa é uma tarefa ciclópica.

Mas há uma coisa a fazer antes de mais nada: abandonar os preconceitos ideológicos, os complexos de esquerda e os clichés – e aceitar pôr tudo em questão.

A recusa dos partidos do sistema em debater descomplexadamente a imigração, está a entregar à extrema-direita o monopólio do debate sobre este tema.

Ora, isso é perigosíssimo.

Os partidos centrais têm de ser mais activos e firmes no combate a este flagelo.

Não podem revelar a passividade e a inocência que têm demonstrado.

Como aceitar, por exemplo, que alguns imãs continuem a pregar livremente a violência e a recrutar  homens nas mesquitas de Paris ou Bruxelas para ataques terroristas?

Como admitir que em Londres haja municípios ostentando à entrada placas dizendo: «Está a entrar numa zona controlada pela sharia [lei islâmica]»?

É inadmissível.

Muitos europeus começam a estar cansados, com medo, aterrorizados mesmo – e, se os Governos não derem respostas concretas, o racismo anti-muçulmano na Europa pode ficar fora de controlo.

E os partidos da extrema-direita continuarão a crescer eleitoralmente e começarão a ganhar eleições.

O tempo urge.

O discurso politicamente correcto já deu o que tinha a dar e não convence ninguém.

Os próprios muçulmanos estão fartos dele, pois a sua vontade é que se comece a separar o trigo do joio, não pagando o justo pelo pecador.

O pior inimigo dos muçulmanos que hoje vivem na Europa é a inacção dos Governos nacionais – permitindo uma liberdade de acção aos fundamentalistas que acaba por virar a opinião pública contra toda a comunidade islâmica.