sábado, 26 de junho de 2010

Sócrates no Torneio de Arcos de Valdevez

Heduíno Gomes

O Conselho de Estado, reunido em Arcos de Valdevez, no âmbito do Centenário da República, prestou homenagem a Mário Soares. O elogio ao homenagiado ficou a cargo de Sócrates. Lendo um discurso que alguém lhe escreveu --, ou seja, Sócrates travestiu-se com o discurso de alguém --, abundava a erudição e a graxa.

A erudição deu para citar Kant (acho que era Kant, mas, se não era, fica na mesma a erudição do engenheiro dos mamarrachos) -- a partir da cadeira de filosofia técnica, feita certamente na Universidade Independente! E deu ainda para -- calcule-se -- falar em latim técnico! Sim, em latim técnico.

Quanto à graxa a Mário Soares, também deu vontade de rir. Enquanto ouvia a graxa, Mário Soares esboçava um daqueles sorrisos de gozo que só ele sabe, como que a dizer: -- A mim não me enganas tu!



Sócrates com o seu diploma de filosofia técnica e latim técnico
da Universidade Independente.

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quinta-feira, 24 de junho de 2010

Fechar a loja

João Pereira Coutinho, Correio da Manhã

O ensino português não pára de nos abismar. Agora, o país ficou a saber que é possível a um aluno de 15 anos, ‘retido’ no 8.º ano, fazer o exame do 9.º e passar para o 10.º. Não é fácil, garante a ministra. Mas é possível: ‘a vontade move o mundo’, disse a dra. Alçada, que imagina um cábula de 15 anos, a bater com a cabeça nas paredes do 8º ano, mas subitamente tomado por uma vontade irresistível de passar para o 10.º.
Não perturbo esta fantasia. Só estranho que a ministra não se sinta perturbada com a imagem que a fantasia revela. Se um aluno não precisa de frequentar o 9.º ano para passar para o 10.º, para que serve o 9.º ano? Aliás, para que serve estudar no 8.º? Para que servem, no fundo, os rituais clássicos da escolaridade clássica – as aulas, a assiduidade, a avaliação contínua e sazonal – quando é possível dispensar estes empecilhos? No limite, a medida da dra. Alçada permitiria desmantelar todo o sistema e erguer um novo: uma espécie de ‘ensino por correspondência’ onde, em rigor, não existiriam escolas, professores ou alunos. Pena que só sobraçasse o Ministério.

Você emprestar-nos-ia dinheiro?

Camilo Lourenço, Jornal de Negócios

Nas últimas semanas alguns bancos europeus andaram a dizer aos mercados que não têm (ou têm pouca) divida dos países em risco de bancarrota. Entre os quais Portugal. A estratégia é clara: mostrar aos financiadores que não andam com más companhias. E que, por isso, qualquer desastre que aconteça a essas más companhias não os afecta.
A consequência imediata desta atitude é que bancos portugueses, mesmo os mais sólidos, passaram a ter ainda mais dificuldade em financiar-se nos mercados interbancários.
Em qualquer país sério isto teria provocado duas coisas: fuga de depósitos e toque a rebate na classe política. Porque não pode haver pior sinal, para um país, do que quando os mercados o passam a olhar como um leproso.
Em vez disso o que temos? Um Governo que não corta despesa corrente (e que exulta com a subida de 15 por cento nas receitas do IVA); um parlamento que chumba uma proposta para congelar o TGV e um primeiro-ministro que diz que só corta salários aos políticos porque a isso se comprometeu com o líder da oposição.
Enquanto isso, aqui ao lado, um Governo sem maioria decidiu cortar salários a quem trabalha para o Estado (a Espanha tem, como nós, um défice externo superior a 10% do PIB) e vai avançar com uma reforma laboral mesmo sem acordo de sindicatos e patrões.
Caro leitor, imagine que gere as poupanças que milhares de trabalhadores colocaram num qualquer fundo de pensões. Emprestaria dinheiro a Portugal?
P.S. - Passos Coelho diz que se o Governo tiver de recorrer a ajuda externa, o PSD não se opõe. Os mercados ficaram a saber que o futuro primeiro-ministro acha que o País não se safa pelos próprios meios.


Morreu um poeta, patriota e amigo de Olivença

Morreu António Manuel Couto Viana


(Viana do Castelo, 24-01-1923 - Lisboa, 08-06-2010)


Poeta e Português, não esqueceu Olivença, oferecendo-lhe o seu Cancioneiro de Olivença (Hugin, Lisboa, 2003).


«OLIVENÇA, A EXILADA»

O pelourinho, a igreja manuelina,
A porta do palácio Cadaval,
A Torre do Castelo, o escudo em cada quina,
Chamam-se Portugal.


O mais, é um casario
Com dois séculos de Espanha,
Branco e frio,
Em frente ao jorro d'água e à palmeira estranha.


Olivença, a exilada! A palavra saudade,
A sua língua de hoje esqueceu-a de vez.
Porém, sente-se a nobreza e alma da cidade
Em pedra e em português.

[Olivença, 05-10-2001]




«CLAMOR»

(...)
Ouvi a alma de Olivença
Cativa do silêncio sepulcral:
Antes que o tempo me convença,
Vem libertar-me sem detença
A minha pátria é Portugal !

[Olivença, 21-08-2002]



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