quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Integração dos imigrantes na Europa:
Um problema muçulmano

Sarrazin provoca uma tempestade na opinião pública alemã

António Justo

As turbulências em torno da pessoa de Thilo Sarrazin e do seu livro“Deutschland schafft sich ab” (A Alemanha abole-se a si mesma) não parecem querer amainar. Sarrazin, ex-ministro das Finanças do Estado Federado Berlim, trata, no seu livro o tema da integração dos muçulmanos nas sociedades para onde emigram, de maneira demasiado clara e indiplomática. Um assunto mantido tabu pela classe política, pela opinião publicada e pelos intelectuais vem manifestar a divisão dos alemães.

As Teses de Sarrazin

Os problemas da integração “situam-se exclusivamente nos migrantes muçulmanos… e isto deve-se ao fundo cultural islâmico”; situa-se “ evidentemente na cultura do Islão”.



É de opinião que a sociedade alemã se estupidifica mais, nas próximas gerações, pelo facto da classe alemã alheia à cultura e dos muçulmanos migrantes gerarem mais filhos, diminuindo assim o potencial intelectual da sociedade anteriormente liderado pela classe média.

Segundo o autor “os turcos na Alemanha geram o dobro das crianças do que corresponderia à sua percentagem na população”. “Os Turcos invadem a Alemanha tal como os ‘kossovares’ invadiram o Kossovo: através duma quota de natalidade superior”.

Vê na procriação muçulmana fecunda “uma ameaça ao equilíbrio cultural da Europa…e representa um risco para o modelo cultural europeu”. Segundo o relatório 2010 da Conferência dos ministros da educação dos estados federados da Alemanha, nas grandes metrópoles Frankfurt, Munique, Colónia e Estugarda, mais de metade de todas as crianças até aos três anos tem base migrante.

Sarrazin lamenta a baixa quota de turcos dispostos a aprender bem a língua alemã prejudicando assim a própria carreira escolar que se reflecte no facto de 54% dos turcos entre os 25 e os 36 anos não terem concluído a formação profissional. Os resultados das escolas alemãs nos estudos comparativos de PISA baixam devido ao insucesso escolar dos turcos na Alemanha. Sarrazin receia assim a diminuição do quociente médio de inteligência da sociedade alemã baseada na vontade procriadora da classe mais baixa. Parece desconhecer porém os factores ambientais. Os turcos certamente não serão mais estúpidos que os outros imigrantes. Estudos provam um nível intelectual inferior das crianças turcas mas não que sejam mais estúpidas.
Com montes de estatísticas apresenta a tese de que os turcos, com muita emigração para a assistência social alemã, “certamente não contribuíram para o nosso bem-estar”. Atesta que “em todos os países da Europa, os migrantes muçulmanos custam mais do que a mais valia económica que trazem”. (Redução da pessoa ao valor económico!)
O autor best-seller atesta e testemunha com números o que o povo pensa.
Contrapõe o direito do Estado “a decidir ele mesma quem quer receber no seu país ou na sua sociedade” ao abandono deste direito aos partidos.
O tema da integração muçulmana (sua resistência à integração) passou a dominar a floresta das folhas dos jornais. Uma Alemanha, que integrou milhões de polacos nos finais do século XIX e 12 milhões de desterrados depois da segunda guerra mundial, sente-se impotente perante 4 milhões de muçulmanos no país. Atrapalha a Alemanha o facto destes parecerem, na sua grande maioria, contentar-se com a aliança da religião e o vínculo familiar, levando uma vida em contraposição e à margem do país acolhedor. O facto dos problemas da França com os seus 5,5 milhões de muçulmanos é visto pelos alemães como um problema consequente da colonização francesa. Cala-se que a economia moderna explora de maneira agressiva os autóctones da classe média e baixa e os migrantes.
O pluviómetro da excitação atingiu alta densidade e não parece haver lugar para uma aberta. Uma opinião pública pautada pela norma da boa educação correcta e pelo tabu social, em que “sobre estrangeiros ou se fala bem ou não se fala”, acorda estremunhada e revela não ter resultado contra o medo sub-reptício da balcanização da sociedade.

Reacção da classe política ao livro de Sarrazin

As elites reagiram com nervosismo e irreflexão: exigiram a sua expulsão da direcção do Banco Alemão e a sua expulsão do partido SPD. A liberdade de opinião é um bem a cultivar enquanto se não se pertence à classe privilegiada!... A direcção do partido quer expulsá-lo mas a base compreende-o e mais de 2.000 cartas foram recebidas na central do partido. 90% eram a favor de Sarrazin.
Os políticos temem o escândalo duma realidade que se quer silenciada. Não admitem que um dos seus questione o pensar correcto que é o dogma hodierno das classes dirigentes. Daí a necessidade destas em desacreditá-lo e em declará-lo como apóstata. Conseguiram afastá-lo da direcção do Banco Alemão mediante a sua indemnização duma pensão vitalícia farta, evitando assim perder um processo em tribunal.
O Povo apoia-o e as chefias dos partidos atacam-no. Com a sua crítica, ele atinge o sistema partidário que em vez de o discutir o ataca a nível pessoal. Na sua repulsa primária, a política distanciou-se ainda mais do povo já em dissidência da política (por este andar, o partido dos não votantes atingirá os 40%). Na Europa, cada vez mais se assiste a reacções histéricas entre políticos e povo. Numa sociedade em que as elites se desintegram cada vez mais do povo, estas não querem reconhecer Sarrazin nas suas fileiras nem um povo que exige vontade de integração aos muçulmanos.
A má consciência política relativamente ao problema da imigração faz-se sentir numa campanha concertada contra Sarrazin, uma crítica virada apenas contra o seu estilo e ignorando a realidade do conteúdo. Mais uma vez se misturam alhos com bugalhos.
Na espiral dum silêncio político envenenado surgem fendas que se tornarão munição para campanhas eleitorais. Segundo prognósticos estatísticos, se Sarrazin fundasse um partido receberia 20% de apoiantes.
As teses provocantes através das quais Sarrazin escreve no álbum dos partidos o fruto da sua negligência no que toca à imigração turca, que sob o manto da reunião familiar passou de 750 mil turcos para três milhões, deixarão rasto profundo na sociedade. 3 milhões de turcos, em grande parte, vivendo em guetos e em torno das suas mesquitas, com os piores resultados escolares em termos comparativos com outros migrantes e com manifesta falta de vontade de integração metem medo a muito alemão que se sente atraiçoado pela política e vive com a impressão que a classe política não protege o próprio país nem a própria cultura e se coloca ao serviço de egoísmos e oportunismos individualistas ou de classe.
O medo e o oportunismo têm muito poder numa sociedade habituada a varrer para baixo do tapete o lixo que produz e os problemas não resolvidos desde os anos 60. Assim o CDU/CSU e Liberais fecharam sempre os olhos aos problemas, no que tocava aos estrangeiros, vendo-os apenas como mão-de-obra barata que vinha solucionar os problemas duma economia em expansão. Os Verdes cresceram sob a bandeira dos estrangeiros e o SPD apenas se preocupou em integrá-los no partido, atendendo ao potencial que significam em termos de votos para o futuro.
Sarrazin, embora político, não gosta do jogo preferido dos políticos: o Pingue-pongue; gosta mais de futebol! Quer ver a bola na baliza ao exigir medidas vinculativas para a integração dos muçulmanos no país.
Do facit da discussão fica a impressão que os alemães preferem continuar a falar alemão macarrónico com os estrangeiros, não tolerando que Sarrazin, o povo, fale alemão claro. Este descreve um estado de facto mas num tom exaltado e metendo, por vezes o pé na poça. E os seus críticos abusam do moralismo ‘multiculti’ para encobrir os próprios erros e para disciplinar ideias da direita. O problema em aberto é que os políticos passam e os problemas ficam.
Depois da campanha contra Sarrazin os partidos parecem voltar à normalidade começando agora a pronunciar-se por uma discussão aberta e falando da necessidade de integração.

Europa em efervescência

Thilo Sarrazin provoca na Alemanha uma discussão que já se vai fazendo sentir noutros países europeus. A Holanda que nos anos 80 era modelo nas medidas de acolhimento e apoio aos imigrantes manifesta agora com reacções xenófobas que o seu latim chegou ao fim.
Por toda a Europa se sente um fervilhar inquieto no povo. Este vê a pobreza a imigrar para a Europa e sente-se mais depauperado pelos próprios Estados onde as leis e os impostos asfixiam cada vez mais o cidadão. Uma insatisfação cada vez mais explícita contra o agir da classe política estabelecida terá como consequência a formação de novas forças políticas. A crise económica e financeira leva os perdedores da sociedade a revoltarem-se contra as elites que cada vez mostram mais desprezo pelos de baixo.
As camadas média e baixa da sociedade sentem-se inseguras num momento em que a União Europeia, as famílias partidárias e a sua burocracia se tornam mais fortes.
Os problemas económicos cada vez mais reais, a esterilidade das mulheres europeias e a resistência muçulmana à integração e correspondente vontade procriadora levam muita gente a sentir o Islão como uma ameaça à própria cultura.
Muitos constatam que os explorados de ontem reagem agora – via imigração e procriação – explorando as leis existentes, a liberdade de religião e a providência social, levando uma vida em gueto em torno das suas mesquitas e afirmando-se contra a sociedade acolhedora. Emigram para fugirem à desumanidade social dos países de origem mas temem os valores da nova sociedade.
Entretanto o estrato social inferior autóctone descobre-se como parte da classe social multi-étnica precária entregue a uma concorrência selvagem. Por outro lado uma classe secular vê na atitude muçulmana contra a emancipação, contra o indivíduo e contra o iluminismo uma ameaça às conquistas republicanas. Vê-se confrontado com uma religião eminentemente política sem política que a confronte. A força ideal reage e aproveita os fracos do poder económica.
A raiva do povo nunca foi boa conselheira mas a incúria política não pode continuar a ser a resposta a problemas a resolver agora, em termos bilaterais.
Os “populistas” terão sucesso porque os nossos políticos revelam menos inteligência do que o Povo em geral.
“Deutschland schafft sich ab” é um livro incómodo para alemães e muçulmanos. O livro reflecte a opinião do povo, a opinião dos que mais sentem os ventos fortes e frios do turbo-capitalismo. Em relação aos outros estrangeiros e seus descendentes concorre para uma discussão mais adequada, uma vez que a imprensa alemã estava habituada a tratar os problemas especificamente turcos sob o manto de “problemas dos emigrantes e seus descendentes”.
Ressentimento por um lado e arrogância pelo outro não resolvem o problema. A integração do mundo turco e árabe na Europa é demasiado complexa para se poder solucionar com simples posições de pró e contra.
Nem a xenofobia nem a arrogância das elites resolverão os problemas de pessoas oprimidas económica e/ou culturalmente. Em tempos de crise todos tendem a sobre-reagir! Na casa em que não há pão todos ralham mas ninguém tem razão!
Na nossa sociedade em ebulição é de preferir um inimigo verídico do que um amigo falso.

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Isabel Alçada é muito boazinha

Imigração ilegal

Vasco Graça Moura, DN

A livre circulação de pessoas no espaço da União Europeia e, muito em especial, no espaço Schengen, tem sem dúvida trazido inegáveis vantagens no que respeita à grande maioria dos cidadãos; mas tem também graves inconvenientes, no que toca à circulação do crime, uma vez que as autoridades policiais dos países envolvidos não conseguem prevenir com eficácia todas as situações que justificariam essa prevenção. E, se acaso conseguem, surgem logo activistas de uma esquerda-qualquer-coisa a falar em direitos humanos para cima e direitos humanos para baixo e a empastelar ou mesmo a inviabilizar actuações perfeitamente legítimas.

Há também gente que esquece o regime especial de condicionalismos e restrições adoptado para a entrada da Roménia e da Bulgária na União Europeia e que finge não perceber que o território desta não pode ser um espaço de importação de miséria e conflitualidade social, por via de entradas clandestinas ou ilegais. Viu-se o que tem acontecido com os africanos nessa situação. Agora, pelos vistos, os ciganos romenos (ou povo roma para usar o mesmo politicamente correcto que faz com que os esquimós tenham passado a chamar-se inuits) em Portugal até seriam indesejados pela própria etnia a que pertencem, como se pode deduzir das declarações de Carlos Miguel Soares, presidente da Câmara de Torres Vedras e cigano, ao Expresso de 18 de Setembro: "os ciganos portugueses vêem com apreensão a chegada dos 'novos ciganos'. Sentem que os seus comportamentos desviantes ou bizarros podem pôr em causa a integração, fragilizar as conquistas já alcançadas".

A propósito do caso francês, imagino que no Parlamento Europeu tenha havido um daqueles alvoroços dos dias grandes, em que a esquerda se esganiça nos mais desvairados decibéis enquanto a direita se encolhe toda, a dizer tremulamente que não, que não é bem assim, e a tentar negociar soluções de compromisso...

Mas também alguma direita mete a sua colherada: mesmo na Comissão Europeia, a senhora Reding, que não tem ofuscado os areópagos internacionais, nem pela argúcia política nem por qualquer outro atributo, no exercício dos cargos de comissária europeia que vem desempenhando ao longo da última década, teve de engolir lestamente o seu comentário precipitado quanto ao que se passa em França e de pedir desculpa por ele.

Houve gente da Igreja que disse identicamente umas parvoíces lamentáveis e falou no Holocausto, esquecendo-se de que o Holocausto conferia um passaporte para as câmaras de gás, enquanto a repatriação dá a cada repatriado umas centenas de euros para voltar ao seu país, nem sequer havendo garantias de que muitas das pessoas nessa situação não regressem a território francês na primeira oportunidade. (Isto também quer dizer que se está numa Europa tão pouco convencida de si mesma que a própria ilegalidade dá lugar a um rendimento oficialmente atribuído).

Talvez as autoridades francesas devam marcar melhor que a questão não tem nada a ver com questões étnicas mas com imigração ilegal. Mas percebe-se que seja premente a necessidade de devolução à procedência dos imigrantes ilegais que vão entrando no seu território. Trata-se de assegurar melhor algumas das obrigações próprias do Estado democrático: zelar pelo cumprimento das leis, pela segurança de pessoas e bens e pela manutenção da ordem pública. Se isto for conseguido - e oxalá o seja! - é provável que a tranquilidade volte às banlieues onde tem sido tão perturbada. Alguém duvida de que a maioria dos franceses vai aplaudir essas medidas?

Desde que se trate dos Estados Unidos ou dos países ocidentais que suspeitem de pró-americanos, a esquerda está aí para as curvas. Agora, o anunciado envio para o olho da rua de 500 mil funcionários públicos cubanos não suscitou nenhuma reacção dos mesmos sectores que soíam embevecer-se com as excelências do castrismo. Nas últimas décadas tem sido sempre assim: quando lhes convém, há criaturas que são acometidas de uma súbita mudez. O que, evidentemente, não as impede de gritar aqui-d'el-rei, num clamor indignado, pelo facto de as autoridades francesas estarem a recambiar imigrantes ilegais para os seus países.