sexta-feira, 30 de janeiro de 2015


Belgistão, a capital islâmica da Europa


Dizem eles que é uma questão de tempo...

E depois há gente a defender o multiculturalismo!


https://www.youtube.com/watch?v=lT4tFVi683g




quinta-feira, 29 de janeiro de 2015


Eleições gregas levarão a Europa

à sala de operações


António Justo

Os partidos do sul da UE, que são contra a política de poupança, sentem-se com asas depois das eleições gregas. O sul pródigo ganhou provisoriamente contra a moral rígida alemã do bem-comum.

O povo cansado quer mudança e deixa de apoiar governantes corruptos que desde 1974 dirigem os destinos da nação. A Grécia é depois da África o país mais corrupto.

O líder Tsypras tornou-se no rosto provocador da Troika (CE + BCE + FMI) e no admoestador da esquerda socialista e comunista.

No parlamento helénico têm assento 300 deputados. Segundo o direito de eleição grego, o partido vencedor recebe um bónus de 50 assentos no parlamento. A coligação governamental de extrema-esquerda com extrema-direita (Syriza + Gregos Independentes) possui 162 deputados (149 + 13) e a oposição que consta de seis partidos, entre eles o partido comunista, tem 138 deputados.

As promessas e o projecto de Tsypras

O primeiro-ministro Alex Tsypras quer obter uma mudança radical da política; o seu modelo ideológico é Ernesto «Che» Guevara.

Declarou não querer restituir os 190 mil milhões de dívidas; quer distribuir pelos pobres 2 mil milhões de euros; 5 mil milhões num plano de emprego e 4 mil milhões em outros projectos.

Concretamente quer energia gratuita para agregados familiares carentes; serviços básicos gratuitos; criar alojamento para os 30 000 sem-abrigo; subir o montante de isenção de impostos para 12 000€ (na Alemanha a isenção é de 8 354 €); aumentar o salário bruto mínimo de 586€ para 751€; criar 300 000 lugares de trabalho; instaurar uma democracia popular. Para isso pretende lutar contra a corrupção, querendo proceder à recuperação de dinheiros do fundo da UE e do fundo de resgate bancário grego.

Situação da Grécia – continuará a ter de mendigar

A Grécia tem um desemprego geral de 25% e um desemprego juvenil de 48%. A dívida do Estado atingiu em 2014 os 320 mil milhões ou seja 180% do produto interno bruto. Desde 2009 tiveram uma perda de rendimento de 30%. No serviço público trabalham 675 000 empregados, isto é, menos 277 000 que em 2009. Apesar de tudo a economia em 2014 cresceu 0,7.

O FMI e a UE concederam empréstimos à Grécia, no valor de 240 mil milhões de euros. Nos finais de Fevereiro a Grécia precisará de novo crédito. A Troika já teme pelos 240 mil milhões porque Tsipras quer governar sem a Troika.

O governo ainda pode dispor de 11 mil milhões de euros do programa de apoio da UE que serão transferidos para a Grécia no próximo dia 1 de Março. Por outro lado teria de reembolsar, este ano, seis mil milhões de euros ao Fundo Monetário Internacional.

Um país com uma dívida de 180% do produto interno bruto nunca poderá vir a pagar as suas dívidas.

A situação terá de melhorar na medida em que as verbas terão de ser direccionadas para a produtividade e deste modo em benefício do povo.

A ânsia de Tsypras por deixar de ser destinatário de ordens dos emprestadores de dinheiro será uma ilusão tal como se verifica com o FMI em relação a países em vias de desenvolvimento exigindo-lhes o cumprimento de condições para se tornarem dignos de crédito. Sair da Zona Euro seria problemático para a Grécia (embora ganhasse mais autonomia) mas significaria perder o comboio da História.

Teoricamente os gregos terão razão mas praticamente não

O país onde democracia nasceu quer puxar as orelhas às democracias da UE. Surge agora uma democracia messiânica de extrema-esquerda. Tsypras diz não querer usar gravata mas também não poderá tornar-se gendarme!

Apostar no consumo sem uma organização económica produtiva que o sustente é música de embalar que políticos tocam para adormecer o eleitorado. É um facto que as firmas de cada nação têm de produzir o suficiente para pagar os seus serviços e as reformas. Por outro lado, um sistema económico (Troika) que tem beneficiado o grande capital e as grandes empresas dos grandes países dando assim razão a quem é contra a poupança louca e quer consumir. A Troika só se preocupou em salvar os bancos, porque se fossem à falência todas as contas bancárias se reduziriam a zero, o que provocaria uma revolução.

A maneira como se poupou não foi eficiente, os investimentos foram mal aplicados e as elites do sistema político e económico serviram-se a elas. O sistema estatal, tal como em Portugal, protege as elites e os gastos vão na direcção errada. Na Grécia 174% da produção económica do país está na mão dos credores. Os títulos públicos gregos a dez anos ascendem a 9% de juros devido à sua falta de fidelidade financial perante um mundo financeiro só interessado nos lucros.

Muitos alemães não vêm com bons olhos a classe política grega e a corrupção que apadrinha. Na Grécia os produtos no mercado são demasiado caros; mas enquanto na Alemanha um iogurte pode estar nas prateleiras até 12 dias na Grécia só até seis. Uma diferença de mentalidade mais ou menos eficiente na produção: em dois anos o gabinete do governo alemão teve 98 sessões de trabalho enquanto o grego teve apenas 9, apesar da situação drástica em que tem vivido.

O BCE num acto de mea culpa já se tinha antecipado à Grécia

O BCE (Banco Central Europeu), apesar de muitas dores de ventre dos países nórdicos, já se tinha antecipado à mudança grega, tomando a decisão de fabricar euros baratos para apaziguar os mercados internacionais, e para poder dar resposta aos países em crise (Assim evitou a desconfiança dos bolsistas).

Os ministros das finanças da UE permaneceram calmos (A economia grega corresponde a 2% da Zona Euro) e a Bolsa mostrou-se indiferente às eleições, registando até uma pequena subida. Isto aconteceu porque o BCE, já tinha prevenindo uma mudança radical na Grécia e tomou, antes das eleições gregas, uma decisão já há anos discutida e devida: o lançamento de 1,4 bilhões de euros até 2016, no mercado da Zona Euro, o que acalmou os investidores, dado o euro barato fortalecer a exportação e favorecer as economias do sul possibilitando a compra da dívida (títulos públicos) dos países mais deficitários.

Urge uma nova atitude nas relações entre UE e os seus membros!

O euro limitou a democracia na Europa. Países e bancos doadores (Troika) só olharam para números o que se revelou um caminho falso. Não consideraram as diferentes economias nem as diferenças culturais entre o norte e o sul da Europa.

Os gregos viram na poupança a mãe do mal e votaram contra a política de austeridade, ditada pelo eixo Berlim-Bruxelas. Até agora, a Troika seguiu os interesses da plutocracia financeira; a Grécia poderia ser um toque a rebate para que apresse uma mudança de atitude em favor das populações europeias.

Tsypras provocará uma reflexão profunda e obrigará (com a esquerda europeia agora avisada e fortalecida) a Troika a fazer correcções ao sistema. Numa luta de díspares, pergunta-se apenas, por quanto tempo se manterá a exigência de uma política europeia para o povo? Na sociedade moderna, com velocidades económicas diferentes e com armas desiguais, torna-se impossível David vencer Golias.

Apesar das muitas vozes para que a Grécia saia do euro, a UE não o quer fazer e por isso agora invertem-se os termos: antes a Troika ditava as ordens, agora a Grécia obriga os grandes a sentarem-se à sua mesa. 80% dos alemães querem que a Grécia cumpra os acordos. Governos instáveis não atraem firmas. No fundo quem vai continuar a pagar as dívidas é o povo grego e o povo das nações do euro. No contexto de interesses divergentes dos diferentes países europeus, será difícil encontrar uma solução que consiga evitar prejuízos para os contribuintes dos países da UE.

Ângela Merkel, símbolo da mentalidade nórdica, quer ser solidária com o sul mas ver, em contrapartida reformas que levem a uma produtividade concorrente a nível mundial; a chanceler pensa a nível da Alemanha e na construção de uma União Europeia forte, mas esquece que a política seguida pela UE favorece os mais fortes e embate com um mundo diferente, que não vem do frio onde se exigem arrecadações para se poder aguentar bem o Inverno, mas de sociedades soalheiras habituadas a viver na perspectiva do dia-a-dia. Encontram-se duas culturas diferentes que se deveriam apoiar, respeitar e aprender uma da outra sem se combaterem.

A UE precisa de um novo plano

Os peritos em economia e política são do parecer que a saída da Grécia do euro seria economicamente suportável mas politicamente muito problemática porque poderia provocar uma bola de neve.

Surgirá um novo plano em que se gaste menos em auto-estradas e invista mais em firmas produtoras de trabalho e riqueza.

A questão das dívidas das nações permanecerá um busílis. Um corte directo das dívidas não será possível porque um país como Portugal teria de perdoar à Grécia centenas de milhões de euros devido ao crédito concedido, quando ele se encontra em situação também precária. Imagine-se que, no caso de perdão das dívidas à Grécia, só a Itália, também ela imensamente endividada, perderia os 40 mil milhões de euros emprestados.

A UE encontra-se num dilema. Sem o perdão de dívidas e sem reformas, o povo grego nunca se porá de pé. Além disso precisa de dinheiro emprestado para as reformas que pretende realizar.

Em vez disso, a Troika usará de instrumentos refinados para conseguir o mesmo efeito: recurso à inflação e, apesar de ela, manter o dinheiro barato (taxa inferior à inflação) com baixíssimas taxas de juros, o que corresponde a comprar tempo.

Entretanto, cada país terá de acertar o passo à concorrência dos produtos a nível mundial. Os custos por peça de trabalho são a directriz da concorrência. Quem produz pouco e produtos demasiado caros, perde a corrida desalmada numa competição global com países de salários imensamente desiguais. Portugal, com o euro, perdeu a concorrência têxtil dos seus produtos em Portugal e na Europa, por não ter tecnologia preparada a produzir a peça ao mesmo preço da manufactura chinesa (por aqui se vê que a UE favorece os países com alta tecnologia e deixa aos outros a concorrência desumana que mais será acentuada por TTIP e TISA).

O euro barato corresponde a uma expropriação dos poupadores e da classe média, aquela que poupa. Na Alemanha, Merkel vê-se pressionada pelos poupadores que vêem o seu dinheiro nos bancos a derreter-se ao sol da inflação que os juros não cobrem.

Há muito dinheiro nos bancos mas estes dificultam créditos a empresas. Os bancos dos países terão de ser obrigados a conceder créditos às firmas em vez de jogarem com o dinheiro que recebem do BCE.

Só uma nova conferência reguladora dos empréstimos e da dívida poderá criar novas perspectivas no sentido de se fazerem investimentos na produção e no crescimento do trabalho e menos em auto-estradas ou objectos de prestígio para políticos. A Troika tem concedido créditos aos estados não se importando o que estes fazem com eles.

A modo de conclusão

Alexis Tsypras tem uma grande carreira à sua frente; faz-me lembrar José Manuel Durão Barroso que, à medida dos nossos revolucionários do 25 de Abril acomodados ao dinheiro e aos privilégios da classe política, foi ascendendo na escada do poder, subindo de chefe do partido maoista PCTP-MRPP até ao cargo de 12.º presidente da Comissão Europeia. Tradicionalmente, o povo precisa de acontecimentos e de pessoas que lhes dêem esperança, para esquecer as dificuldades do momento; o problema é que em cada mudança ou revolução os novos portadores de esperança deixam-se corromper pelo poder, sem os eleitores o notarem, tal como aconteceu com a Grécia e com o 25 de Abril em Portugal.

O poder é assim; por isso todos devem participar dele para o tornar mais controlado e humano. Norte e sul, esquerda e direita são os extremos do mesmo problema! No caminho do tempo as margens perdem-se num nome, tal como as razões do povo que as determinaram. Decisivo é praticar o bem andando direito e a direito. A União europeia encontra-se numa encruzilhada e na sala de operações para se poder levantar mais vigorada e continuar a seguir o caminho da libertação e da dignidade humana, sempre novo, mas já delineado pelos nossos antepassados.






Oposição extraparlamentar

em marcha na Alemanha


António Justo

PEGIDA é o barómetro do estado de espírito da Nação

Numa sociedade em que o tema sobre estrangeiros desfruta de um interesse relevante tanto positivo como negativo, organiza-se uma oposição extraparlamentar que quer manifestar o seu descontentamento com a política dominante. Desta vez saem regularmente à rua os que não têm oportunidade de se expressar.

O movimento PEGIDA(1) surge, do descontentamento de massas, numa época política em que a democracia já não age em relação aos acometimentos do neocapitalismo e aos problemas sociais, limitando-se a reagir e a esconder-se por trás de um discurso público onde sobressai a hipocrisia. O povo desorientado cada vez se vê mais confrontado com discursos em que falta a cultura dum debate à luz da dignidade humana que deveria ser a matriz da religião, da democracia e da discussão. Os políticos não entendem a voz do povo e o povo sente-se manipulado por interesses que não são os seus.

Causas de insatisfações manifestadas na sociedade europeia-alemã

Uma maioria silenciosa expressa-se em diversos grupos que lhe procuram dar voz. Um sistema social, com jovens e idosos pobres, desesperançados sem perspectivas profissionais, desempregados de longa duração, carentes sociais dependentes da assistência social sem lóbi, tem o descaramento de, com medo, difamar um movimento pacífico dos que não têm a chance de se tornarem visíveis nem oportunidade de dominarem as páginas dos jornais como outros grupos. A pressão na Alemanha exercida, pelos partidos estabelecidos e pela sua imprensa, sobre um movimento popular torna-se avassaladora. Quando o chanceler Kohl exigia maior rigor em relação aos delinquentes estrangeiros até o SPD esteve de acordo, mas agora que Pegida exige o mesmo, é considerada «indecente». (Penso que a exigência formulada é problemática, mas usar dois pesos e duas medidas para estigmatizar um grupo, como se faz hoje nos media contra a mesma tese, não testemunha a equidade na argumentação). Torna-se sempre problemático quando uma parte banaliza a problemática e a outra a singulariza. Tolerância deve valer para todos.

As teses escritas por Pegida soam bem mas os cartazes das manifestações permitem suspeita de infiltração de forças fundamentalistas interessadas em fender a sociedade. As teses são aceitáveis mas «sob uma fachada pode mover-se algo diferente». Medos reais ou difusos de manifestantes e contramanifestantes procuram encontrar qualquer pretexto para drenar o seu vapor. A raiva do povo foi crescendo ao observar que por exigências de muçulmanos (e outros por trás deles), têm sido fórmulas de juramento alteradas e o crucifixo e certos símbolos cristãos têm saído de lugares públicos; além disso observam o sistema de excepção com horários em piscinas públicas para mulheres muçulmanas, isenção de participação em visitas de estudo e em aulas de ginástica; além disso nomes de feiras tradicionais como o Mercado de Natal têm cedido o nome para Mercados do Inverno, etc., tudo incomoda ao não serem verificadas contrapartidas. Aqui junta-se o interesse de muçulmanos ao de organizações secularistas que não suportam referências públicas ao cristianismo (assim muita da agressão contra muitos muçulmanos deveria ser procurada noutros meios que instrumentalizam a religião, como se dá num radicalismo de extrema-esquerda em torno de Charlie). Tudo isto torna mais difícil identificar as causas da insatisfação que depois é atirada para as costas da religião. (Em Portugal também se assiste a uma luta contra a face pública do cristianismo por parte de um socialismo e de uma maçonaria radicais, não se podendo culpar os muçulmanos por tal). Os muçulmanos além da sua situação problemática de comunidade minoritária que se quer afirmar é utilizada por forças secularistas camufladas radicais (instaladas nos estados e com grande lóbi na UE) como pretexto para impor interesses que não têm nada a ver com os religiosos, pelo contrário.

Quem apoia incondicionalmente as caricaturas de Charlie e critica as manifestações de Pegida julga com duas medidas. As caricaturas expressam, a seu modo, as suas críticas e as demonstrações expressam pacificamente, a seu modo, os seus medos colocando perguntas à classe política dominante e a que esta não responde e adia.

A classe política sente-se insegura e questionada

O fenómeno Pegida e as reacções em torno dela são típicos da sociedade alemã; através das intervenções dos políticos nos media, das manifestações e contramanifestações, formam-se consensos que estabilizam o sistema.

Com Pegida a classe política sente-se especialmente incomodada porque o movimento parece conseguir expressar não só os rumores do ventre popular mas também os receios da classe média. O novo partido AfD já metia medo à actual constelação parlamentar e agora junta-se Pegida, associação de utilidade pública, com temas problemáticos quentes que poderão desestabilizar, nas próximas eleições, o partido CDU. O perigo para a concorrência partidária é real, Merkel (CDU) nunca se expressou tão claramente como fez agora em relação a Pegida embora este movimento se expresse dentro da conformidade democrática!

Para a classe política, o importante é trazer o povo alinhado e neste sentido, não importa a argumentação fundada, quando muito, a opinião!

Nas ondas do sentimento, longe das raízes dos factos, surge a provocação de grupos de manifestantes que fomentam conflitos porque cada qual rebaixa o outro em nome do seu direito à liberdade esquecendo que a sua liberdade deve conter a liberdade do outro. Em luta todo o pretexto vale e assim todos se tornam culpados. Pegida tem medo da imigração muçulmana e os manifestantes contrariadores têm medo de perder o poder ou de movimentos de centro-direita virem a ocupar parte dos seus nichos na sociedade e na política.

A sociedade encontra-se doente e cheia de preconceitos tanto nos que motivados pela emoção como, em grande parte, nos que aparentemente motivados pela razão.

Massas à deriva

Tudo se limita a reagir sem pensar as coisas até ao fim. Os fundamentalistas servem-se da generalização, dum modelo de pensar a branco e preto não poupando atributos como «islão terrorista» e «pegida nazi». Outrora argumentava-se com o comunismo para dividir e ordenar a população, hoje faz-se o mesmo com a religião e com grupos incómodos ao sistema. A liberdade de opinião e manifestação deve valer para todos, também num sistema em que o desprezo do pobre não é considerado racismo nem a extrema diferença entre pobre e rico é tida como discriminação.

Os caricaturistas sob a bandeira republicana e em nome da liberdade provocaram muita gente e sentiam-se no direito de ridicularizar a religião, como se não houvesse outros valores ao lado da liberdade nem outros valores a defender senão os do estado laico. O outro lado reage em nome de Deus para calar a voz secular. Os pequenos grupos de provocadores instrumentalizam politicamente a religião e os estrangeiros para rasgarem a sociedade. Como quem usa a violência ganha, a curto prazo, a sociedade tornou-se mais violenta.

A Europa está com medo que a sua fortaleza não resista à sua preponderância económica e cultural; tem medo de ver os seus valores ameaçados (Charlie, Pegida, manifestantes e contramanifestantes). Aqui no centro da Europa, a sociedade ferve; o que impede a explosão é o facto de ter um alto nível de vida económico e social. Um medo difuso e uma insatisfação geral provocam um clima de guerrilha entre uns e outros. Há muito que a Europa não age, apenas reage às investidas do neocapitalismo e aos problemas sociais. A consequência é uma magnetização política e social fomentadora duma desconfiança onde, perante a incapacidade da política, cada qual procura ganhar à custa do outro.

Por vezes a imprensa corre o perigo de apresentar os terroristas como vítimas; por outro lado transmitem a impressão que religiões são o instrumento propício, para a origem de guerras, lançando, além disso, todas as religiões no mesmo pote. O fundamentalista não está interessado em construir pontes, arrenda a razão e a verdade só para si.

Uns defendem a multicultura outros a intercultura.(2) Precisa-se de gente que saiba encontrar o ponto de intersecção dos pontos comuns para, a partir daí, se construir pontes no diálogo social. Tarefa difícil atendendo à força dos lóbis e ao pensar politicamente correcto em função duma classe política promiscuída com a oligarquia do capital. Quem não tem lóbis não tem voz nem risca no sistema.

Gueto contra gueto, generalizações simplistas, muita lavagem ao cérebro, a má avaliação de uns e outros constituem impedimento para encarar os assuntos no seu âmago. Precisa-se de mais ironia em relação à opinião pública e à opinião do outro. Uns media acríticos e acólitos da classe política falhariam a sua função social se continuassem a ter de esconder factos também incómodos em relação à realidade social com a desculpa de quererem impedir argumentos que xenófobos poderiam usar. A focagem deve ser centrada nas falhas da política e da economia que manifestam um vácuo de acção onde prospera a dessolidarização da sociedade.

Os muçulmanos têm de esclarecer que os extremismos de jihadistas e do Estado Islâmico não são consequência do Corão e das Hadith; Pegida tem de se distanciar de extremismos e a política tem de deixar de se envergonhar do cidadão. Pegida reage com medo do islamismo e este medo, se articulado com agressão, leva o muçulmano a encerrar-se em si mesmo com medo de se manifestar fora. O medo e a luta não ajudam ninguém mas poderiam levar os mais distantes a ocupar-se a fundo do assunto.

Todo o crente ou ateu que, em nome da ciência ou da religião, se arroga o monopólio do saber, para condenar ou desqualificar o outro, segue as pegadas do fundamentalismo, alimentando-se no mesmo húmus que conduz ao radicalismo das barbáries de Paris e Nigéria. É fundamentalista um movimento, um partido, uma ciência, uma ideologia ou uma religião que se considere possuidor da razão e da verdade em relação aos concorrentes ao querer impô-la. A exclusão e a generalização alimentam o fanatismo. Todos somos maus, quer sejamos estrangeiros ou alemães, ateus, cientistas ou religiosos, quando se trata de atacar e julgar o outro! Por isso toda a afirmação tem apenas um aspecto de luz com muita sombra a acompanhá-la.


(1) PEGIDA é a sigla que designa em português «Europeus patriotas contra a islamização do Ocidente»; a associação pretende: migração selectiva, política de lei e ordem mais estrita, a reconciliação com a Rússia e atitude crítica em relação à UE. O seu objectivo é «promoção da capacidade de percepção política e a consciência de responsabilidade política». PEGIDA organiza manifestações às segundas-feiras desde 20.10.2014 em Dresden, tendo-se associado outras cidades à iniciativa. O atentado de Paris ajudou a dividir a sociedade civil. Na Alemanha os ânimos da classe disputante encontram-se muito acesos.

(2) A problemática em torno da imigração é um sintoma de causas indiferenciadas que se apresenta como um pretexto para protestar contra a classe política distanciada das preocupações populares. Esquerda e direita procuram pescar turbando as águas do outro. Uma sociedade só orientada para o consumo e para a posse torna-se susceptível de demagogia. Esquece-se a experiência de estrangeiros descriminados mas também a de jovens alemãs serem muitas vezes apelidadas de «cadela vadia alemã» ou seja prostituta pelos seus hábitos sociais não corresponderem a códigos turcos ou árabes. Também a existência de bairros em cidades alemãs onde se não ouve falar alemão causa medo a muito cidadão vizinho. Denegrir uns ou outros não serve a democracia. Verifica-se que ao contrário do que acontece nas manifestações da Pegida, nas manifestações paralelas contra ela praticam-se actos violentos e ataques contra a polícia mas os custos de proteger as manifestações são atribuídos aos manifestantes pacíficos. A imprensa, geralmente mais ao lado da classe política ataca Pegida e não comenta os ataques violentos de manifestações de grupos de esquerda.





domingo, 25 de janeiro de 2015


Um atentado à portuguesa


Rui Ramos

Sócrates, o seu governo, a sua influência começam a justificar mais do que uma série de artigos de jornal ou processos parcelares: o regime tem de confrontar directamente este fantasma.

Lemos o Correio da Manhã, e espantamo-nos. Menos com o Correio da Manhã, do que com o silêncio acerca do que o jornal desvendou nas suas últimas edições. Trata-se, mais de uma vez, de José Sócrates. O ex-primeiro ministro já foi acusado publicamente – e convém sublinhar o publicamente – de conluios, cumplicidades e alinhamentos com banqueiros, empresários e magistrados para, enquanto governante, se apoderar de bancos (como o BCP), decidir grandes negócios (como a OPA da Sonae à PT), condicionar a comunicação social (no caso da TVI-Media Capital), e limitar a justiça (no processo Face Oculta). Tudo foi comentado e analisado a seu tempo (por exemplo, aqui). O Correio da Manhã envolve-o agora numa operação, já depois da saída do governo, para tomar conta de uma parte importante da comunicação social portuguesa (através do domínio da Controlinveste, TVI, e PT).

Num editorial dramático, o jornal descreve mais este capítulo da saga socrática como uma «grave ameaça sobre a liberdade de expressão e de imprensa», e chama-lhe um «novo atentado ao Estado de Direito», recuperando a expressão do procurador João Marques Vidal no seu célebre despacho de 23 de Junho de 2009. E de facto, tudo o que é revelado no Correio da Manhã, mais o que consta há muito tempo, configura não só um padrão de actuação, mas uma filosofia: a de alguém para quem o essencial da política não é persuadir os cidadãos e debater com os adversários, como nas democracias, mas acumular meios de controle, manipulação e impunidade, como nas ditaduras.

Perante tudo isto, não basta tratar o Correio da Manhã como um jornal «sensacionalista», e confundir estas notícias com as revelações sobre o fim do namoro do Ronaldo, de que não se fala nos salões bem-pensantes. Também não basta dizer que há uma investigação judicial a decorrer, e que não se pode tomar conhecimento do que transpira na imprensa. O regime tem a obrigação de esclarecer se o que corre sobre alguém que liderou um dos maiores partidos portugueses e governou este país durante seis anos – e que, no que é politicamente relevante, vai muito para além da chamada «Operação Marquês» – é ou não é verdade.

Se for verdade, teremos de reconhecer que a democracia portuguesa enfrentou uma verdadeira conspiração a partir do poder, e que só a crise financeira de 2010-2011, ao arruinar o socratismo, poupou o regime ao domínio de uma facção sem escrúpulos e à confrontação política que fatalmente resultaria desse domínio. Desde há 40 anos, ensinaram-nos a reconhecer um golpe de Estado: o parlamento fechado com tanques à porta, e um general de óculos escuros, na televisão, a anunciar a proibição dos partidos e a censura à imprensa. Ninguém nos preparou para outra hipótese: a degradação por dentro do próprio regime, através de combinações entre os oligarcas para diminuir de facto a liberdade e a transparência da vida pública.

E se não for verdade, se Sócrates nunca quis conquistar bancos, se nunca fez negócios, se jamais influenciou magistrados, e se era alheio a quaisquer manobras na comunicação social – para além de inocente dos crimes de que é actualmente arguido –, então valerá a pena examinar como é que, a partir dos tribunais e da imprensa, foi montada esta mistificação sinistra, que fez um político democrático e honesto parecer um émulo do Catilina de Cícero.

Por enquanto, este é um atentado à portuguesa, que aconteceu ou não aconteceu conforme as opiniões. Mas vai sendo tempo de avançarmos para além das «narrativas». As narrativas servem apenas para cada facção dar estrutura aos seus preconceitos e demonizar os adversários: Sócrates foi um corrupto, que governou com o único objectivo de roubar; Sócrates foi um grande líder reformista, que está a ser perseguido pelos juízes a quem tirou uns dias de férias. Deixemos isto para socráticos e anti-socráticos. Precisamos de factos. É uma urgência nacional.

O trabalho dos jornalistas e dos magistrados é fundamental. Mas José Sócrates, o seu governo, a sua influência e a sua reputação começam a justificar mais do que uma série de artigos de jornal ou processos judiciais parcelares: o regime tem de confrontar directamente este fantasma, e um dos meios para o fazer é um inquérito parlamentar, em que todos os que tenham algo a dizer sejam formalmente questionados. O que se passou em Portugal, ou melhor: o que se está a passar em Portugal? Se não tivermos uma resposta, a pergunta ficará respondida da pior maneira.