sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O rei Obó

  Uma pequena observação sobre a utilidade  
 dos presidentes da República                      


António Marques Bessa

É de comum entendimento que o Povo nunca foi considerado para nada. As formas políticas foram implantadas à margem. Num país profundamente monárquico fundado e dirigido por grandes reis até certo ponto do processo histórico, a minoria republicana, alojada nas cidades mais desenvolvidas, fez questão de assassinar o Rei e o Príncipe herdeiro e depois dar um golpe de baú e ficar com o poder com uns senhores licenciados que foram tornados grandes heróis à custa de propaganda tendenciosa e escandalosa, que pretende ocultar um horrível homicídio que funda a República e vários assassinatos que se seguiram. Neste ponto a História dos factos é clara. Não importa de que lado nos coloquemos, mas é um facto indesmentível que os assassinos impuseram a nova forma política que vigora.

De então para cá apareceu a nova figura que substituiria o Rei Constitucional : o Presidente da República. Ficando tudo como dantes, com os bandos políticos, que não chegam a ser partidos, os conluios, as negociatas estrafegantes entre políticos e banqueiros, os bandidos do costume, o apelo ao povo e à massa que quer pão e circo, com o carrossel de promessas nunca cumpridas mas que a massa esquece no dia seguinte, enfim com aqueles ingredientes que serviriam para preparar no caldeirão de um druida a poção de envenenamento precoce de um país, paralisando-o no tempo. Todos deveriam saber que Salazar é um produto da República, todos deviam conhecer que o mal começa na Monarquia final e que se estende e continua reforçada na República, eminentemente medíocre tal como era o regime monárquico que derrubou.


O TAL PR DA REPÚBLICA PORTUGUESA

Enfim, com a mania de copiar, como a macaco de Deus, as instituições derrubadas, a República entendeu que devia ter um Presidente representativo, um sujeito igual ao Rei Obó, que é um faz de conta.

Esse Presidente ficaria sempre amarrado pela tal Constituição, a coisa que é mortífera. Nesse papel que uns tantos sujeitos engendraram numa Assembleia Legislativa, convocada para o efeito e votada pelo povão ignorante. O tal Presidente, substituto do Rei, é um pobre diabo: um gato-sapato que pode fazer figura de urso quando quiser, arrotar umas postas de corvina, mas sem efeito algum. Está atado e bem atado e nunca se percebe porque razão tal posto desencadeia eleições ferozes, disputas terríveis nos quase-partidos, a não ser que seja tal ambição despertada pelo gabarito da vivenda que vai habitar, normalmente um palácio da Monarquia, dos formalismos de que se vai rodear, dos ordenados que vai receber, dos dinheiros do Orçamento que pode gastar, tendo para seu serviço uma enormidade de serventuários, que vão de humilíssimos contínuos a chefes de casas pomposamente designadas como «Casa Civil» e «Casa Militar» e depois assessores e intermediários de toda a espécie, que tenho dificuldade em compreender para que servem. A não ser que queira propositadamente fazer chacota com o cargo político. As mulheres destes ditos PR fazem de rainhas e visitam orfanatos, casas de rapariguinhas abandonadas, dão-se às obras de misericórdia, podem criar organizações onde pontificarão depois como grandes damas, porque o tempo está contado. O Presidente é sempre o Rei Obó, a Presidenta, coitada, faz o que pode no circuito em que se insere.

É infeliz verificar que o Cavaco do tempo antigo, combativo e normal, agora PR com a idade que conhecemos, tenha de fazer este papel tão triste e cuidadosamente obscuro, que não dignifica ninguém. Nem o povão, nem ele. O Obó podia sair duma espécie de lotaria popular, por sorteio. Qualquer infeliz dos bairros da lata, com algumas lições de piano, desempenharia o papel. Mas nunca se lembraria de evocar como grande referência a infeliz ideia da «ética republicana».


A TAL ÉTICA

Que ética é essa? Figurará nos pais gregos da Filosofia no celebrado livro «Ética a Nicómaco», mede-se por padrões clássicos de livros de ética ou é a nova ética de Rawls?

De facto, se é ética republicana, só pode ser a do assassinato justificado pelos últimos fins: a instauração de um novo regime político decididamente contra o anterior. É, no fundo, uma ética dos fins, o que justifica qualquer meio: qualquer Governo fica justificado: trata da sua vidinha e persegue os inimigos, mesmo aniquilando-os. Estavam certos os khmer vermelhos e está certa a alta chefia ilustrada da Coreia do Norte e os mortíferos assassinos talibãs e todos os assassinos em massa da História. Para chegar aos fins, nunca hesitaram nos meios a utilizar. Essa é a tal ética Republicana prática e conhecida em Portugal e não se venha dizer que era a da SPQR ,ou seja, da República Romana, porque logo se perguntaria pelas tribos, pelas famílias importantes, pelos escravos e pelo regime de propriedade.

A ética do rei Obó não pode ser a nossa. Como explicou bem de mais Max Weber, há uma ética de meios e há meios que não se podem utilizar porque destroem o ser humano na sua essência e potencialidade, reduzindo-o a um peão e a um escravo do sistema. Isto é o que se sabe, mas como o povo nunca sabe nada, nem nunca poderá reflectir sobre estas questões, é terrível que um rei Obó qualquer venha com estas conversas, em vez de se limitar à sua função decorativa e palaciana. Já não há ingenuidades nesta classe política velha, consumida e cheia dos mesmo vícios da I República. Também não há ingenuidades nos tarefeiros que se ascenderam ao poder, montados na máquina dirigente dos «quase-partidos», e ainda na onda dos votos do povo explorado como rebanho. Armam-se depois em guardadores de rebanhos, mas eles não são cães pastores: são os lobos. E não é que todos, desde o PR ao mais ínfimo na ordem de bicadas ou ordem do poleiro (pecking order), não querem desistir do protagonismos, das benesses , das compensações de estarem «ao serviço de Portugal». Portugal, com tantos que o querem servir nestes tempos, abafa e morre, porque o fim último é servirem-se dele. Afonso de Albuquerque, Dom João de Castro, D João II, para lembrar só alguns, serviram imemoravelmente bem Portugal. Comparem-se as obras, os feitos.

Será claro nesta altura de um tempo que se vive sem esperança, que quem deseja estar sossegado e contente no rebanho, pastoreado como ovelhas para o matadouro da lucidez e do que conta, por gente Obó a fingir que tem um grande palco de 200 milhões de fiéis, como o Presidente dos Estados Unidos, pode ficar a viver o seu miserável quotidiano. Mas nem o quer, sempre poderá dar um passo mais na floresta, como convidaria o velho e sábio Ernst Jünger que não nos cessa de provocar com a imagem de um mundo melhor e mais límpido: ora os altiplanos entrevistos no livro «Falésias de Mármore», ora a floresta que se vê como destino em «Ewmesville», que nunca foi um livro fácil. Mas o que é bom, nunca foi fácil. O que bom é ser um cidadão completo como o grande Sócrates, que bebeu a cicuta que lhe ofereceu a Cidade, podendo ter ido embora como o incitavam os seus admiradores. Aceitou a lei da Cidade e morreu. Descanse em paz e viva para sempre na nossa memória.


A simpatia jornalística pelos gays

Pedro Vassalo

Escrevo usando dois chapéus: o de ex-jornalista e de co-organizador da manifestação em defesa da família, no sábado em Lisboa. Reivindico o estatuto de ex-jornalista, porque este artigo versa sobre a cobertura do Públiico à manifestação de sábado. Paralelamente, reconhecendo-me como parte interessada, o assunto toca-me mais fundo e admito, até, perder alguma objectividade na análise ao texto do Públiico. Mas não me parece ser o caso. Vamos por isso aos factos: das 97 linhas, a 4 colunas, que o Públiico dedicou ao assunto (página 8, de 21/02), no texto assinado por Maria Lopes, 69 das linhas (ou seja mais de 70% da notícia) foram dedicadas a descrever uma “confusão entre activistas da Acção Nacional (AN) e um grupo de gays”. Convém, agora, cuidado na análise. Não se tratou de confrontos físicos, nem de empurrões ou desordem pública. Tratou-se apenas de “insultos fortes de dezena e meia (15) de rapazes da AN …enquanto os defensores do casamento gay lhes acenavam e mandavam beijos”. Já antes, Maria Lopes escrevia que (os gays) “estavam várias dezenas de jovens com tambores, apitos, serpentinas e cartazes”. Ou seja, a própria jornalista reconhece que a contra manifestação dos gays (sem qualquer espécie de autorização e com o único intuito de provocar) era superior, em número, aos que se deixaram provocar. Maria Lopes poderia ter-se interrogado sobre a existência desta contra manifestação, convocada com o único propósito de provocar. Mas nada. Poderia ter meditado que a ser assim não poderá nunca haver qualquer manifestação ordeira, como é pressuposto da democracia, porque bastam umas dezenas de arruaceiros que distraiam os jornalistas do conteúdo da mensagem do desfile. Como foi o caso! Poderia ter perguntado aos gays como se sentiriam se fosse ao contrário (imagina-se o coro de protestos). Poderia ainda ter notado que das milhares de pessoas na manifestação (a PSP refere 5 mil), apenas “dezena e meia”, ou seja 0,003%, se deixou arrastar na infeliz troca de insultos com os gays. Poderia ainda perceber que sendo (qualquer) manifestação um acto público, não é possível (mal ou bem) impedir quem quer que seja de participar. Finalmente poderia, num exercício de equilíbrio jornalístico, referido que a organização fez um esforço visível para ignorar os apupos dos gays apelando aos “rapazes da AN” para que fizessem o mesmo. E eu sei disso, porque estava lá (identificado) a fazer esse trabalho. Caso a jornalista quisesse, era impossível não ter percebido isso.

Maria Lopes não fez nada do muito que poderia ter feito. Preferiu gastar mais de 70% do espaço a dar voz a contra manifestantes que, insisto, sem qualquer autorização, só lá estavam com o propósito de provocar, e chamar a atenção dos media. Conseguiram.

Finalmente, poderia lembrar que nenhuma organização não partidária, ou sindical, junta 5 mil pessoas na Av. Liberdade. Poderia ter perguntado pelas dificuldades, como e quem paga o quê, o que os move. Nada! Poderia recordar que houve mais de 92 mil assinaturas reunidas em 3 semanas por causa disso (quantas é que os gays reuniram?). E não vale dizer que a Igreja patrocinava a manifestação. Porquê? Porque da última vez que a Igreja “desfilou” em Lisboa, fechou a cidade de Entre Campos aos Restauradores (com a Imagem de Nossa Senhora de Fátima). Eu sei que é difícil ao jornalista distanciar-se do facto, não se envolver e procurar a objectividade. Mas Maria Lopes exagerou. E ninguém lhe agradecerá, a começar pela comunidade gay, que não acredito se reveja naqueles arruaceiros e no método.

PS: Fui jornalista mais de 12 anos. Colaborei em rádios (RR e RDP) em Jornais (Correio da Manhã, Século, 24 Horas, Jornal de Negócios, Semanário) e na RTP. Fui “comentador / cronista” em rádios, jornais e na RTP. Chefiei secções de economia e fui autor de programas de informação.