António Justo
Tornou-se
num lugar-comum, representantes de instituições islâmicas, em situações
semelhantes às dos atentados de Paris, se desculparem dizendo, tratar-se de um
atentado contra o Islão, ou ainda, que «eles não são muçulmanos!». Seria
incorrecto a Instituição islâmica julgar-se vítima, quando em seu nome e também
através de estados islâmicos se espalha o terror por todo o mundo. (Não falo
aqui da responsabilidade do Ocidente, atendendo ao espaço e já ter tratado o
tema noutros artigos).
É
verdade que não se pode taxar um grupo inteiro de culpado do que acontece em
seu nome. Uma «desculpa de mau pagador» para sacudir a água do próprio capote,
perante desinformados. Seria negador da realidade e testemunho de hipocrisia
negar que a «guerra santa» (Jihad) e
os atentados têm a ver com o Islão.
Torna-se
urgente um diálogo sério que ajude muçulmanos e não muçulmanos. Os
muçulmanos moderados, para se tornarem verdadeiramente credíveis, têm que
demonstrar que os extremistas invocam, injustamente, as suras do Corão para
justificarem a sua luta. O Encargo de prova recai sobre as associações
muçulmanas. Os eruditos e responsáveis do Islão teriam de dizer
publicamente que o Corão não é para ser seguido à letra e as suras não são
válidas universalmente. Aqui se encontra o busílis da questão porque
nenhum mestre ou mufti se atreve a afirmar tal, dado entenderem as suras do
Corão como directamente ditadas por Deus (no Corão nota-se que Alá mudou de
opinião aquando da mudança de Maomé de Meca para Medina – isto poderia servir
de motivo para os peritos muçulmanos permitirem a análise histórico-crítica
praticada nas ciências teológicas).
Por
isso se tornam difíceis declarações públicas por parte de muçulmanos e se
dificulta um diálogo onde os intervenientes, se comportam como o gato, a fazer
batota em torno do leite quente! A gentileza junta-se à falta de honestidade
intelectual ao distrair os públicos com aspectos mais ou menos moralistas ou de
conveniências e vivências sociais, em vez de ir ao problema de fundo que se
encontra nos princípios doutrinários imanentes ao sistema e aqui só em segunda
mão na situação social injusta em que, por vezes, vivem.(1)
Os teóricos islâmicos têm de demonstrar, nos
países para onde imigraram, como é que o Islão é compatível com as formas de
democracia com separação do estado e religião, e com os direitos humanos. Este seria o primeiro passo ao serviço da integração e de um diálogo
sério entre Islão e democracia. Um tal diálogo ajudá-los-ia a dar o passo para
a reforma do Islão. (E porque não até, desenvolvendo uma outra
forma de democracia?).Seria um atestado de pobreza se o viessem a fazer apenas
a partir das universidades europeias, obrigadas a fundar faculdades islâmicas
para formarem os professores de religião islâmica nas suas escolas.
No Corão há muitos versos onde se apela à
violência contra «Kuffar» (não
muçulmanos = indignos de vida, também apelidados de porcos e macacos, cf. sura
8,22 e sura 5,59-60). «A paz islâmica só se alcança, quando todos os cristãos, judeus
e pagãos forem extirpados» (Corão, sura 9,33…). Na Alemanha tem sido proibida a
publicação do livro «Minha Luta» de Hitler, o Corão, em contrapartida tem sido
distribuído aos milhares pelas cidades alemãs. Nem se exigem notas explicativas
para versos apeladores à violência, como se queria exigir em relação a «Minha
Luta» caso fosse publicada.
Não
sou defensor da proibição de livro nenhum, só me horroriza o cinismo de uma sociedade que actua com dois pesos e
duas medidas e como é fácil levar o povo, ontem como hoje. Hitler que defendia a superioridade da raça germana e
o extermínio dos judeus é proibido, o Corão que considera a religião muçulmana
como única e apela ao extermínio dos diferentes, não é questionado. Não
é de negar que em «Minha Luta» e no Corão se encontram também muitas frases
humanas e muitas contradições que ajudam quem luta. Da neblina e da confusão só
podem viver melhor os mais espertos.(2)
Segundo
historiadores, as religiões, geralmente, não estão na origem das guerras. A
origem encontra-se em desigualdades económicas na sociedade. As religiões
actuam como aceleradoras porque implicam maior comprometimento ao dar mais
importância à acção.
Continua
em «Primeiro a dignidade humana depois a instituição»
(1) Não, quando na qualidade de representante dos
estrangeiros da cidade da minha residência lutava pelos direitos dos turcos e
dos estrangeiros, pude observar, num espaço de 15 anos, uma grande mudança de
atitude na sociedade muçulmana, antes muito pacífica e as mulheres com menos
lenços na cabeça, embora vivendo em gueto. Com o tempo tornou-se mais
agressiva, à medida que via surgir dela gente formada na universidade. A partir
de então organizavam-se sobretudo na defesa dos próprios interesses, entendendo
solidariedade no sentido muçulmano. Um facto é que de mais de cem
nacionalidades (e muitas religiões) a viver na cidade quem não aceitava
integrar-se eram os muçulmanos. Alguém dirá mas também a raça cigana não se
integra; facto é que não se afirma na definição contra a sociedade que os
acolhe e permanecem uma minoria em qualquer vila ou cidade. Naturalmente a
sociedade aberta deve também ela aguentar uma certa tensão. O problema surge quando
falta a solidariedade social e se legitima a luta como maneira de se fazer
valer e uma sociedade maioritária discrimina. Se não houver um esclarecimento e
empenho no sentido da integração então as nações tornar-se-ão mais cépticas
quanto à recepção de muçulmanos. Aqui não está em discussão a questão da
sociedade ocidental mas apenas a relação entre dois modelos de sociedade
vigentes.
(2) Digo
isto porque sou amigo dos muçulmanos e crítico do Corão e dos Hadhit (Hadiz) e
gostaria de um diálogo em que a pessoa humana seja respeitada e defendida,
pense ela o que pensar, mas que se olhe com espírito crítico para as
instituições que alinham as pessoas em torno de si para fins fomentadoras de
domínio e imperialismos à custa da humanidade. O Islão só ganhará com uma
reforma profunda.