quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Olivença (cativa) em banho-maria

João José Brandão Ferreira

A portuguesíssima Vila de Olivença caiu cativa do Exército Espanhol, em 1801, numa infeliz campanha, que ficou conhecida por “Guerra das Laranjas”.

Se nenhuma razão assistia aos espanhóis (na altura aliados aos franceses), para nos atacarem então (uma das 18 vezes que o fizeram no território europeu), nenhuma razão lhes assiste até hoje em a reterem, por via da contestação, logo iniciada em 1807, pela Coroa Portuguesa, e pela decisão do Congresso de Viena, de 1815, que manda devolver a praça.

Vicissitudes históricas e fraquezas nacionais várias, têm feito com que o governo de Madrid continue a fazer tábua rasa das razões do Direito e da decência das relações entre os povos, e continue a reter e usufruir do esbulho de Olivença e seu termo, ou seja 461,5 Km2 de território português, que o era desde o Tratado de Alcanises, de 12 de Setembro de 1297.


E sem vergonha o faz, pois internacionalmente continua a defender a recuperação de Gibraltar onde poucos direitos lhe assistem e a querer manter Ceuta e Melilla, numa contradição gritante com o que intenta sobre Olivença.

Penso que isto consegue ser perceptível aos políticos de Belém à Gomes Teixeira, passando por S. Bento, mesmo aos mais distraídos e ignorantes. Por maioria de razão se podem apontar os experientes diplomatas com quartel-general nas Necessidades.


Quanto mais não fosse esta posição política e diplomaticamente vulnerável da Moncloa e da Zarzuela, poderia servir para que o governo português pudesse intentar outros passos, que não apenas o da tradicional posição de não reconhecer juridicamente a ocupação, manter o pedaço da fronteira interrompida nas cartas militares e, até ver, não querer reconstruir a ponte da Ajuda que liga as duas margens do Guadiana, na zona em litígio. E note-se que tal se passa, depois de ambos os governos se declararem “democráticos” terem aderido à CEE, em simultâneo, pertencerem à mesma organização internacional de defesa comum (a NATO) e declararem um pelo outro as maiores provas de amizade e estima. Encontram-se, até, semestralmente, para discutirem os assuntos, de interesse comum, em cimeiras que as autoridades nacionais, imprudentemente deixam chamar de “ibéricas”, em vez do correcto “luso-espanholas”. E insistem no erro.

Ora entre “amigos”, não existem questões que não possam ser abordadas. E, enquanto não se chegar a uma fase de negociação, assiste-nos o direito de reaver o território em falta, por todos os meios, incluindo a força. Está na Constituição.

Passando-se as coisas assim, um grupo de portugueses transversalmente percorridos por todas as cores políticas, religiosas e sociais, decidiram constituir uma Associação Patriótica, em 1938, que denominaram “Grupo dos Amigos de Olivença” (GAO), a fim de lutarem pelo retrocesso do território e não deixar cair esta grave ofensa no olvido. Essa acção não sofreu até hoje, qualquer solução de continuidade.

E foi neste âmbito que o GAO promoveu uma petição pública, em 2000, reunindo 5049 assinaturas para que a questão de Olivença fosse debatida no Parlamento.

Esta petição foi discutida em 2004, na Assembleia da República dando origem a um processo. Como, entretanto, nada se passasse, o GAO enviou uma carta aos diferentes grupos parlamentares, solicitando uma audiência, a fim de ouvir os deputados sobre o andamento do processo.

Apenas o PCP respondeu, sendo uma delegação do grupo recebido pelo deputado José Soeiro. Este sugeriu que o GAO entrasse em contacto directo com a Comissão dos Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas (CNECP). Assim foi feito.

A 8 de Julho de 2010, no seguimento de contacto prévio, uma delegação do GAO foi recebida pelo presidente do CNECP, Dr. Ribeiro e Castro, que informou da nulidade da petição, colocou algumas questões sobre a realidade oliventina e se mostrou curioso sobre a Associação Além – Guadiana.

Seguiu-se uma segunda reunião a 6 de Outubro.

Finalmente a CNECP convocou o GAO para um derradeiro encontro que ocorreu a 21 de Outubro, em que se informou ter o MNE sido recebido na Comissão e ter reiterado a posição clássica do estado português.

De tudo podemos concluir que o tema é considerado como sendo hipersensível, por todas as forças políticas e órgãos do Estado e que ninguém quer tocar no “status quo”. Foi ainda proposto que se atribuísse a dupla nacionalidade aos Oliventinos que o desejassem.

Uma palavra para a Associação Além-Guadiana.

Em 2007 o GAO recebeu uma carta directamente enviada pelo governo espanhol e assinada pelo primeiro-ministro Sr. Zapatero. É verdade, isto aconteceu. Do facto foi dado conhecimento a quem de direito.

Nesta missiva o governante espanhol mostrava-se aberto a todos os contactos e iniciativas de âmbito cultural e social. Obviamente não tocava no aspecto político e de soberania.

Ainda hoje não se entende muito bem o objectivo desta carta.

Passado uns tempos – e sem estar a querer relacionar uma coisa com outra – foi fundada a Associação Além-Guadiana, em Olivença, que se tem mostrado muito activa e cujos desígnios são o de preservar a herança cultural portuguesa naquelas terras. Existem contactos entre esta associação e o GAO, até agora amigáveis e frutuosos.

A questão de Olivença está por resolver e justificam-se iniciativas políticas para lhe dar uma solução consentânea com o Direito Internacional, a Justiça e o bem comum das partes. E o facto de ter havido colonialismo forçado, de “nuestros hermanos” sobre o território e suas gentes não lhes outorga direito algum. Incoerência até, com o facto de não aceitarem o resultado de qualquer referendo em Gibraltar!

Mas para que os órgãos políticos portugueses se mexessem, é fundamental que a opinião pública nacional, acorde da sua letargia e ultrapasse a sua ignorância e desleixo para com este tema.

Até para ser coerente, por exemplo, com as atitudes que teve para com a causa timorense num passado muito recente.