terça-feira, 3 de julho de 2012

Não à privatização da TAP




Ricardo Monteiro 

Sou um dos muitos portugueses que dependem da TAP para o seu trabalho. Nesse aspecto, pouca é a diferença que me separa dos mais de cinco milhões de concidadãos nossos que vivem pelo mundo fora, de Caracas a Timor, passando por Luanda, Rio de Janeiro, Luxemburgo, Maputo, etc., etc..

Num país como Portugal, que ainda hoje beneficia dos restos quinhentistas, a existência de uma linha aérea que nos una à nossa diáspora é uma função estruturante da nação, algo que, no seu limite deve ser considerado como uma actividade soberana, da mesma forma que o direito de defesa nacional, de administração da justiça, de salvaguarda dos interesses nacionais onde que eles se encontrem. Efectivamente, a primeira obrigação do soberano - neste caso o Estado Português - é assegurar a união, coesão e defesa da comunidade que o constitui e lhe dá legitimidade, onde quer que ela esteja. Nenhum país exerce essa função de soberania com mais alarde que os Estados Unidos da América. Onde estiver um cidadão americano em perigo, é expectável o desembarque dos «marines» ou, mais sub-repticiamente, o envio de uns operacionais da CIA para trazerem o homem de volta. Ora, paradoxalmente, no país onde tudo é de privados (até fazer a guerra, como se viu no Iraque), existe um impedimento legal para a compra por empresas estrangeiras de participações maioritárias em qualquer das suas linhas aéreas..... O Brasil faz a mesma coisa!

Existe, no entanto, em Portugal, uma inveja rasteira relativamente aos trabalhadores da TAP. É frequente a conversa de café que invoca os salários «milionários» dos pilotos, os hotéis de luxo em que se hospedam, as poucas horas que trabalham, etc., etc.. Confesso que até eu exaspero às vezes pelo tratamento arrogante a que muitas vezes sou submetido e também já vociferei em voz baixa que o que eles precisam mesmo é de «ser privatizados»... Mas esse é meramente um problema de gestão. Como é o de resolver os continuados prejuízos da holding TAP (não do transporte aéreo, que dá lucro). Mas, e de que monta são esses prejuízos? A verdade é que a simples intervenção no BPN, de má memória, cobriria mais de 40 anos de perdas na TAP.

As «rendas» anuais da EDP cobrem pelo menos, cada ano, cinco anos de tinta vermelha da nossa linha aérea. Como Nação, «velha e imortal», privatizar a TAP é o equivalente histórico a D. Manuel ter dado a exploração das caravelas quinhentistas a navegadores espanhóis. A TAP é o pouco que ainda nos une ao passado e dá esperança a milhões de portugueses num futuro mundial. Nas palavras muito abusadas de António Vieira, "para nascer Portugal, para morrer o mundo".

Como português, quero embarcar em Lisboa, não em Madrid, para chegar ao Recife, quero estar em Luanda e regressar aqui já em solo nacional. É um direito pelo que estou disposto a pagar. É um exercício de soberania a que o Estado não pode subtrair-se.

Um obrigado a Miguel Sousa Tavares por ser a única voz de peso que se insurge publicamente contra a privatização da TAP. 

Ricardo Monteiro, CEO ibero-americano da Euro RSCG

Os Espaços Estratégicos de Interesse Nacional e o Futuro


segunda-feira, 2 de julho de 2012

A propósito do último livro do General Loureiro dos Santos


J. Brandão Ferreira









«As Forças Armadas são o poder da consciência nacional, o braço da Pátria, a Nação em atalaia a vigilância dos túmulos, a segurança do presente e do porvir. Nobreza não há maior que a da sua missão».

Batista Pereira

«Directrizes de Rui Barbosa», 1938

Instituto Superior de Estudos Militares, sala à pinha, imprensa escrita e falada, camaras da televisão. Era dia 30 de Maio de 2012.

Esperava-se gente importante e outros apenas com funções importantes, que apareceram.

Estavam assim reunidos os ingredientes para haver impacto mediático se é que, fora do futebol, isso é possível…

Falaram o General Ramalho Eanes, que apresentou o livro e o autor. Dois bons discursos, se me é permitido opinar.

O principal objectivo do livro – explicar a necessidade de existência das Forças Armadas, numa linguagem (e também no preço e no número de páginas), acessível ao grande público – não deixa, outrossim, de ser uma boa ideia, embora tardia. Uns 25 anos tardia.

Não havendo pastel de bacalhau nem espirituoso dito de honra, cedo as tropas «recolheram a quarteis».

Durante o «destroçar», um senhor general, cujo nome não interessa referir, atirou-me «en passant»: «Quando é que você escreve um discurso destes?»

Não cogito a intenção da frase (o senhor general um dia mo dirá se assim o entender), mas achei curioso e fui ler os discursos.

De facto não escreveria nada daquilo, dadas as circunstâncias actuais, apesar de reafirmar a bondade dos textos e até de relevar a frase com que o autor do livro acabou a sua intervenção: «Até porque as crises financeiras e económicas conseguem levar-nos os anéis, mas as crises de segurança além dos anéis podem arrancar-nos os dedos…, quando não as próprias vidas».

Por isso e apesar daquilo que nos vem sendo matraqueado, desde 1789, sobre a «igualdade», nós somos todos diferentes (graças a Deus e não ao «supremo arquitecto»), o meu discurso seria diferente.

Uma das missões de um chefe militar, quiçá a principal, é a de preparar as suas tropas (e a Nação) para a «guerra que há - de vir», e uma das razões fundamentais de muitos desastres militares, foi justamente esquecer este princípio, sendo o esforço feito no sentido de «combater melhor a guerra que passou»…

Ora o livro e os discursos não estando voltados para o passado vêm sobretudo falar da importância que as FAs devem ter numa sociedade (democrática), o que representa uma “guerra” em que se foram perdendo todas as batalhas, nos últimos 25 anos…

Por isso uma das opções do meu discurso seria tentar explicitar as razões e o porquê dessas derrotas, pois sem tal se perceber não poderemos obter sucesso no futuro, por mais livros que se escrevam e discursos que se façam…

Sobre este assunto já escrevi o suficiente para me fazer doer os dedos (e o espírito) pelo que sobre isso não me vou castigar e aos leitores, novamente.

Colocar na interrogativa algumas decisões, governamentais, tomadas sobre as FAs, nos últimos tempos, sem apontar opções claras, é uma questão de estilo que não discuto. Tem a ver com as tais idiossincrasias das desigualdades humanas.

Já na listagem resumida das «ameaças» foi deixada de fora aquela que tenho por mais importante de todas, pois se não a anularmos, essa ameaça impedirá, de per si, que possamos fazer face a qualquer outra.

Essa ameaça é representada pela classe política que tão mal tem (des)servido o País e o próprio sistema político que a permite. Ambos os factores são causa e efeito um do outro. Esta causa/efeito tende a perpetuar-se.

Deixando de lado incompetências várias, corrupções, negociatas, etc., que também são consequência da causa/efeito e têm que ser dirimidas pela acção política, pela polícia e pelos tribunais, existem dois eixos de orientação política, que se têm que considerar deliberados (pois caso contrário só uma demência avançada os poderia justificar).

Estamos a falar da desconstrução do Estado e da subversão da Nação (tendo presente que o estado é a nação politicamente organizada).

A principal razão para que tal suceda resulta de, em Portugal (e na Europa Ocidental), imperar a ideia «internacionalista» em detrimento do desiderato nacional.

Ora se as principais forças políticas (e quem lhes puxa os cordelinhos – seguramente, não o povo) defendem que o ideal a seguir é sermos cidadãos do mundo, até ver da “Europa” (seja lá o que isso for), o conceito de Nação passa a ser um formidável obstáculo a semelhante objectivo.

O corolário lógico é a sua destruição; o método é subverte-la.

O sucesso tem sido tão grande – podemos apresentar páginas de exemplos que o corroboram – que o país se está a suicidar lenta, mas literalmente. Basta atentar na «diluição» acelerada que a emigração e imigração, potencia, e que a demografia negativa exponencia.

Toda esta trama vai fazendo com que a soberania esteja a ser transferida dos órgãos nacionais que a representam, para as instituições internacionais representadas pela ONU, NATO, etc., e, principalmente a União Europeia.

Isto quer dizer que, se as funções tradicionais do Estado estão em alienação – não se devendo esquecer as privatizações, sem lei nem roque, que nos vão retirar as empresas a energia, a água, a terra, etc., até ficarmos sem nada em mãos portuguesas, para que é preciso o Estado?

Para já o que resta do Estado serve, fundamentalmente, para ser correia de transmissão de poderes exógenos, cobrar impostos e garantir os negócios necessários à sobrevivência de amigos e familiares.

Neste estádio as FAs além de serem desnecessárias (até haver umas «europeias») são outrossim um perigo, pois guardam no seu «ADN» os genes da Nação.

Com isto dito, lembraria ao senhor PM e MDN presentes, que os políticos não foram mandatados para acabar com «aquilo» que Afonso Henriques começou e dura há quase 900 anos.

E lembraria à Instituição Militar e ao povo português, que o dever das FAs é defender a Nação – e não a República como, certamente por lapso, foi referido.

Estas seriam as vertentes principais do discurso que faria.

Pois, pelo andar da carruagem, não iremos ficar só sem os anéis, os dedos e, talvez a vida mas, também, sem a alma.