terça-feira, 19 de novembro de 2013

Democratas irritados com falhas no Obamacare
votam ao lado do Partido Republicano


Alexandre Martins, Público

O Presidente dos EUA anunciou uma solução na quinta-feira, mas 39 membros da Câmara dos Representantes aprovaram uma proposta que a Casa Branca já prometeu vetar.
Barack Obama prometera que todos os segurados
iriam poder manter os seus planos de saúde
Os erros na aplicação da reforma do sistema de saúde nos EUA provocaram uma cisão no Partido Democrata. Um dia depois de Barack Obama ter feito uma concessão, ao anunciar que todos os beneficiários vão poder manter os seus seguros antigos durante um ano, 39 membros da Câmara dos Representantes ajudaram a aprovar uma proposta do Partido Republicano que vai longe de mais no entender da Casa Branca.

É cedo para saber se Barack Obama subestimou as consequências de uma mentira ou se estava disposto a enfrentar o afundamento do que ainda lhe restava de popularidade, mas por estes dias não se fala de outra coisa nos EUA: a reforma do sistema de saúde, conhecida como Obamacare, pode nem sequer ter tempo suficiente para provar que é um remédio adequado.

Depois de ter prometido várias vezes ao longo dos últimos três anos que ninguém iria ser obrigado a mudar os seus seguros de saúde com a entrada em vigor da nova lei, milhares de cidadãos que contrataram planos a título individual têm recebido notas de cancelamento. Afinal, nem todos podiam manter os planos que já tinham, mas por uma razão que a Administração Obama – e talvez também o senso comum – considera meritória: os planos mais antigos não cobriam os mínimos impostos pela nova lei, entre os quais a inclusão dos filhos como beneficiários e a proibição de se negar seguros a pessoas com problemas pré-existentes.

Um mês depois da abertura das inscrições para o novo mercado de seguros, o processo tem-se revelado uma verdadeira catástrofe política para a Casa Branca. Os problemas técnicos no acesso ao site HealthCare.gov – onde se pode conhecer, comparar e contratar planos considerados mais justos, segundo a Administração Obama – só vieram piorar o cenário.

Mais do que os alegados méritos da reforma no sistema de saúde – que só poderão ser avaliados a longo prazo –, está em causa a honestidade do próprio Presidente e a competência dos serviços federais para garantirem uma transição sem problemas. Nesta sexta-feira, o The Washington Post escreveu que a empresa contratada para desenvolver o site HealthCare.gov, a CGI Federal, emprega mais de 100 altos funcionários de uma outra empresa que foi responsável por pelo menos 20 falhanços em projectos de tecnologias de informação desenvolvidos para o Governo federal.

O problema é que o resultado do somatório das questões políticas e técnicas está a deixar de pé atrás milhões de jovens norte-americanos, saudáveis, cuja opção pelos novos planos de saúde é essencial para manter os preços dos novos seguros nos valores actuais.

Depois de muita pressão de todos os lados – das pessoas que viram os seus seguros antigos cancelados; do Partido Republicano porque os erros da Casa Branca caíram como mel na sua feroz oposição ao Obamacare; e do Partido Democrata, porque há eleições intercalares dentro de 12 meses e é preciso dar explicações aos eleitores –, o Presidente Barack Obama anunciou na quinta-feira que as seguradoras vão poder renovar os planos anteriores durante o próximo ano. Era uma saída quase em desespero porque o mal já estava feito, como reflecte o título da revista The Atlantic: «Obama diz que se quiserem manter os vossos planos, podem mantê-los. Desta vez é a sério».

Como seria de esperar, a proposta da Casa Branca não foi suficiente para aplacar o ataque cerrado dos republicanos. Mais surpreendente – e sintomático – é que também não serviu para travar a rebelião no Partido Democrata.

Afinal, a conferência de imprensa de Obama, durante a qual o Presidente pediu desculpa sete vezes, foi também uma tentativa para impedir que os democratas da Câmara dos Representantes ajudassem a aprovar uma proposta mais radical do Partido Republicano, posta a votação na sexta-feira.

Resultado: pelo menos 39 membros do Partido Democrata não foram sensíveis aos méritos da solução apresentada por Barack Obama e juntaram-se aos republicanos. Segundo esta proposta, as seguradoras poderão não só renovar os seguros antigo como também propor os mesmos planos a novos potenciais clientes durante o próximo ano.

A proposta está condenada à nascença – o Senado está muito mais dividido do que a Câmara dos Representantes e o Presidente já anunciou que irá vetá-la se chegar à Casa Branca –, mas a irritação de muitos democratas é evidente e foi verbalizada por Nick J. Rahall II, eleito pelo estado da Virginia Ocidental, no The New York Times: «Estou revoltado. Acho que deviam rolar cabeças. Os responsáveis por isto ou quem já sabia que isto ia acontecer já devia ter perdido o emprego».