domingo, 1 de maio de 2011

Portugal e a Finlândia

João J. Brandão Ferreira










“Se Portugal assume hoje lugar de destaque
no calendário diplomático das nações, não
o deve só à sua posição geográfica e mariti-
ma, pois ela sempre existiu através dos vá-
rios acontecimentos internacionais, mas
sem resultados plausíveis. A razão é outra,
não menos digna de ser citada: o exemplo
honesto do viver português; a clareza da
sua administração; a seriedade dos seus
princípios de franca e leal colaboração e
cooperação pela paz e pelo progresso da
civilização”.

                                Winston Churchill – 1948

Tem suscitado algum mal-estar a atitude do “partido dos verdadeiros finlandeses” em não quererem aceitar a ajuda de resgate da UE a Portugal, no âmbito da actual crise financeira que é, antes de mais, um problema político e um problema moral. E podem emprestar-nos um trilião de euros que o problema financeiro não desaparecerá, enquanto estes dois últimos aspectos não forem debelados.

Este mal-estar fez surgir um texto muito bem escrito, da autoria do embaixador Seixas da Costa e de outro do correspondente da TSF, Hélder Fernandes (embora com um lamentável erro e equivoco, neste último).

Os textos criticam, de uma forma elegante, mas dura, a atitude finlandesa, que é neste momento apenas de uma parte dos seus cidadãos mas que, por arranjos partidários, pode vir a assumir-se como uma posição governamental.

Não se pode dizer que os textos não sejam pertinentes e não apelem ao sentimento de justiça e da decência nas Relações Internacionais, chamando ainda a atenção para a solidariedade entre os povos e os altos e baixos que todas as nações têm ao longo da sua História.

Contudo, na situação presente, não cremos que este seja o mote em que se deva pôr o acento tónico. A tónica deve ser colocada em emendar a mão dos nossos erros e apurarmos responsabilidades, não na reacção alheia. Sem isto não ganharemos o respeito de ninguém.

Que diabo, nós não estamos credores de solidariedade por causa de uma catástrofe natural; uma agressão militar injusta ou uma epidemia de cólera! Nós estamos de mão estendida para que outros venham cá tapar o buraco financeiro que nós abrimos por termos gasto o que não tínhamos e aplicado mal o que gerimos…E, ainda por cima, não se trata de nenhuma ajuda desinteressada, já que nos vão cobrar juros exorbitantes e obrigar-nos a uma ditadura de tutela! À atenção dos democratas…

Nós temos de saber organizar-nos e produzir e não ficar à espera dos excedentes que outros criam; nós devemos querer estar numa posição de poder emprestar e que outros nos queiram emprestar, porque sabem que as nossas finanças são saudáveis, a moeda forte e honramos os nossos compromissos a horas e até ao último cêntimo - como acontecia num passado ainda recente.

Nós devemos querer estar numa posição de decidir o que fazemos, independentemente das pressões, como é exemplo a venda de volfrâmio durante a Segunda Guerra Mundial; e até saber colocar-nos numa situação de poder ceder apoio e solidariedade sem ter que cobrar por isso, como foi o caso da utilização da base das Lajes pela USAF, até à renegociação de 1971 (salvo erro), pois a soberania não se aluga e a divida era, assim, moral e não podia ser quantificada.

Finalmente, nós deveríamos tentar estar num plano, de tal modo superior, que até pudéssemos restituir ajudas que não tinham que ser ressarcidas, para enviar bofetadas de luva branca a quem nos ofende, como foi o caso da devolução da ajuda no âmbito do Plano Marshall, aos EUA, em 1962.

Mas só se pode conseguir tudo isto tendo estadistas à frente dos destinos do País e a Nação estiver imbuída de altos ideais e bons exemplos e hoje não temos nem uns nem outros.

Os povos podem não ter o governo que merecem, mas não estão isentos de responsabilidades e sofrem-lhes as agruras ou as bonomias. E não é uma qualquer autarquia, um clube de bairro ou um vendedor de jornais que representa o país: São o PR e o Governo.

A má governação contumaz e a demagogia política (doença infantil da Democracia), colocaram-nos numa situação em que atraímos a comiseração e o desprezo de muitos mas, também, os exploradores da desgraça alheia e os abutres que aguardam o cadáver adiado. O desentendimento crónico entre a classe político – partidária e as birras pessoais dão de nós todos uma imagem confrangedora.

Bom será, portanto, pôr ordem em casa em vez de nos indignarmos com críticas que nos assentam como uma luva. Ficam bem estes arrobos de dignidade e até de bravata, que as duas cartas revelam, mas não resolvem a nossa divida nem iludem a nossa vergonha.

Ter Dignidade é, sobretudo, não a perder.

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