Helena Pereira, Sol
Um país onde «a
corrupção e o nepotismo alastraram impunemente». Onde «as estruturas económicas
são medíocres e tímidas». Onde se vive num «ambiente de rarefacção do Estado
Social». Este é o retrato de Portugal, feito por um grupo de senadores, a quem
o Governo pediu um trabalho sobre a revisão do Conceito Estratégico de Defesa.
O grupo, presidido pelo
social-democrata Luís Fontoura, inclui pessoas como Adriano Moreira, Luís
Amado, Jaime Gama, Leonor Beleza, Ângelo Correia, Gomes Canotilho, Pinto
Balsemão, Figueiredo Lopes, João Salgueiro, o general Loureiro dos Santos e o
almirante Vieira Matias.
A comissão, de 25
membros, tomou posse em Junho, numa cerimónia no Forte de S. Julião da Barra, a
que o próprio primeiro-ministro compareceu. Depois, a 11 de Outubro, nova
cerimónia formal, presidida por Passos Coelho, para a entrega do trabalho.
Aguiar-Branco manifestou, nessa altura, o desejo que o novo CEDN fosse «um
documento realista, exequível, que não seja apenas para registo da História,
mas um guião mobilizador do que deve ser a intervenção do Governo».
O texto final devia ser
levado a Conselho de Ministros até final do ano. As ideias, contudo, são
polémicas e criaram desconforto, não só junto do Ministério da Administração
Interna, como na Presidência da República, que não tiveram conhecimento do
relatório. No caso da Presidência, há até razões formais para que isso tivesse
acontecido: a legislação em vigor atribui ao Conselho Superior de Defesa
Nacional, liderado pelo PR, competências prévias na aprovação deste documento.
Percebendo o problema, o
Ministério da Defesa já nem quer comprometer-se com uma nova data para a
aprovação do novo Conceito Estratégico, que está a ser trabalhado, há várias
semanas, por membros da equipa de Aguiar-Branco. O trabalho da equipa de sábios
é tido, no Ministério da Defesa, «como um contributo entre vários».
Aquele trabalho faz, por
um lado, um diagnóstico muito negro da actual situação do país. Por outro,
formula uma série de propostas polémicas, nomeadamente sobre a GNR e a PSP, que
esta semana levaram inclusive à ameaça de direcção da PSP. Por último, na parte
estrita de defesa, é muito ambicioso.
O texto é duro no que
diz respeito às vulnerabilidades internas. Assim, Portugal é visto como «um
protectorado» que luta «pela sua sobrevivência» e em que «a intervenção indébita
e egoísta das corporações profissionais e económicas, está para além dos
limites aceitáveis». E a crise que o país atravessa «pode desencadear fenómenos
de contestação e radicalização, detonantes de uma conflitualidade
político-social susceptível de pôr em causa o regime democrático». Já a
Justiça, permitiu a «impunidade» dos «prevaricadores de colarinho branco».
Mas tem também várias
propostas concretas que surpreenderam o próprio ministro da Defesa. Defende uma
negociação com a UE que permita «aliviar o peso da dívida externa contraída
pelo Estado após o início da crise financeira internacional».
Propõe ainda a criação
de uma «unidade de Segurança Nacional que funcione no Gabinete do
primeiro-ministro» para «sintetizar» a informação recebida dos Ministérios dos
Negócios Estrangeiros, da Defesa Nacional e da Administração Interna, e do
Sistema de Informações da República.
E defende uma separação
entre PSP e GNR, com a primeira a ficar responsável pelas áreas urbanas e
policiamento de proximidade, enquanto a segunda deverá combater a criminalidade
mais violenta e o terrorismo – levando Miguel Macedo a demarcar-se publicamente
de tal visão, vista como uma ingerência inaceitável.
Um dos membros da comissão de revisão do
CEDN explicou ao SOL que os vários elementos organizaram-se em grupos de
trabalho sectoriais e que é normal que não concordem necessariamente com todos
os pontos do texto.
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