José António Saraiva
Não sou nem nunca fui adepto
de teorias da conspiração. Em 99% dos casos não passam de fantasias delirantes.
Por isso, o leitor não inclua por favor a história que vou contar nessa
categoria.
Quando o Governo nacionalizou
o BPN, os accionistas da sociedade, por intermédio de Miguel Cadilhe
(que não é propriamente uma pessoa sem credibilidade), tinham acabado de
apresentar uma proposta de viabilização do banco.
O Governo recusou-a e partiu
para a nacionalização, com o argumento de estar a defender as poupanças dos
pequenos depositantes.
Sabe-se no que aquilo deu.
Assim, não é correcto atirar
todas as culpas para os accionistas.
Estes propuseram-se salvar o banco, o Governo é que não os deixou.
Claro que podiam não o ter conseguido.
Mas, aí, a responsabilidade seria deles – e o Estado não se teria metido naquela alhada.
Recorde-se que, na altura em que o BPN foi nacionalizado, o Governo controlava a CGD (que é pública) e já dominava o BCP, através de Santos Ferreira e Armando Vara, ambos socialistas e próximos de Sócrates, que tinham vindo da Caixa para ali.
Simultaneamente, Sócrates mantinha óptimas relações com o BES, dada a sua conhecida boa relação com Ricardo Salgado, que sempre o defendeu (quebrando a distância que mantivera no passado em relação à política).
O Banif também era muito vulnerável às pressões governamentais, dada a sua precária situação financeira.
Pode pois dizer-se que, com a nacionalização do BPN, o primeiro-ministro passou a «controlar» boa parte da banca portuguesa: controlo directo da Caixa e do BPN, ascendente sobre o BCP, grande proximidade com o BES e neutralidade do Banif.
Só verdadeiramente o BPI, liderado pelo irreverente Fernando Ulrich, escapava ao controlo do Governo socialista.
E, mesmo assim, Sócrates namorou o chairman daquele banco, Artur Santos Silva, convidando-o para elevados cargos.
Vejamos, agora, o sector dos media.
Sócrates controlava directamente o grupo RTP, que é do Estado (e do qual faz parte a RDP).
Tinha também bastante influência na Controlinvest, mercê das dívidas deste grupo à banca, sendo do domínio público os telefonemas cúmplices entre José Sócrates e Joaquim Oliveira.
E a Controlinvest inclui meios como o Diário de Notícias, o Jornal de Notícias, a Máxima e a TSF.
Sócrates mantinha também relações estreitas com a Ongoing, de Nuno Vasconcellos e Rafael Mora, detentora do Diário Económico.
Entretanto, através da PT, o Governo montou uma operação para comprar o grupo TVI, mandando um emissário a Espanha (Rui Pedro Soares) para tratar do negócio.
Este grupo, além da TVI, detem meios como a Lux e a Rádio Comercial.
Só fugiam ao controlo do Governo o grupo Impresa, liderado por Balsemão, e o grupo Cofina, de Paulo Fernandes.
Mesmo assim, ainda houve uma tentativa de assalto à Impresa por parte da Ongoing.
Quanto à Cofina, o Governo conhecia bem a vocação «negociante» de Paulo Fernandes e nunca recearia muitos males vindos daí.
Finalmente, José Sócrates fez uma tentativa para fechar o SOL – através precisamente do BCP, que era accionista do jornal.
O SOL era um David ao pé de vários Golias, mas irritaria Sócrates precisamente por ser um dos poucos media que ele não controlava.
E – recorde-se – foi este jornal que denunciou o caso Freeport, o caso Face Oculta (compra da TVI e tentativa de controlo de outros media) e o caso Tagusparque (apoio eleitoral de Luís Figo).
Fica claro, portanto, que houve um momento em que José Sócrates esteve mesmo à beira de dominar ou ter o apoio de importantes meios de três sectores nevrálgicos:
– Banca, com a CGD, o BPN, o BCP e o BES;
– Comunicação social, com a RTP, a RDP, o DN, a TSF, o JN e a tentativa de compra da TVI;
– Poder político, através do domínio da máquina do Governo e do aparelho do partido, onde não se ouvia uma única voz dissonante.
Só hoje, quando olhamos para essa época, percebemos até que ponto estivemos à beira do abismo.
Como foi possível permitir que se concentrasse tanto poder nas mãos de um homem psicologicamente tão instável?
E como foi possível derrubá-lo?
O que derrotou Sócrates, primeiro, foram as contas públicas – que, contrariamente aos outros sectores, ele se revelou incapaz de controlar.
Tentou até à última esticar a corda e evitar um Resgate, mas a corda acabou por partir – e isso foi a sua primeira grande derrota.
Depois foi a derrota eleitoral.
E esta constitui uma homenagem à democracia.
A democracia mostrou a sua força ao conseguir apear um homem que, à escala do país, acumulou um enorme poder «de facto».
Ele julgar-se-ia quase invencível, mas as urnas derrubaram-no.
Por isso, é muito natural que, embora afirme o contrário, hoje odeie a democracia.
P.S. – Numa entrevista publicada no fim-de-semana, Sócrates mostrou por que lhe tenho chamado «o Vale e Azevedo da política». Com uma diferença: Vale e Azevedo é mais educado.
Estes propuseram-se salvar o banco, o Governo é que não os deixou.
Claro que podiam não o ter conseguido.
Mas, aí, a responsabilidade seria deles – e o Estado não se teria metido naquela alhada.
Recorde-se que, na altura em que o BPN foi nacionalizado, o Governo controlava a CGD (que é pública) e já dominava o BCP, através de Santos Ferreira e Armando Vara, ambos socialistas e próximos de Sócrates, que tinham vindo da Caixa para ali.
Simultaneamente, Sócrates mantinha óptimas relações com o BES, dada a sua conhecida boa relação com Ricardo Salgado, que sempre o defendeu (quebrando a distância que mantivera no passado em relação à política).
O Banif também era muito vulnerável às pressões governamentais, dada a sua precária situação financeira.
Pode pois dizer-se que, com a nacionalização do BPN, o primeiro-ministro passou a «controlar» boa parte da banca portuguesa: controlo directo da Caixa e do BPN, ascendente sobre o BCP, grande proximidade com o BES e neutralidade do Banif.
Só verdadeiramente o BPI, liderado pelo irreverente Fernando Ulrich, escapava ao controlo do Governo socialista.
E, mesmo assim, Sócrates namorou o chairman daquele banco, Artur Santos Silva, convidando-o para elevados cargos.
Vejamos, agora, o sector dos media.
Sócrates controlava directamente o grupo RTP, que é do Estado (e do qual faz parte a RDP).
Tinha também bastante influência na Controlinvest, mercê das dívidas deste grupo à banca, sendo do domínio público os telefonemas cúmplices entre José Sócrates e Joaquim Oliveira.
E a Controlinvest inclui meios como o Diário de Notícias, o Jornal de Notícias, a Máxima e a TSF.
Sócrates mantinha também relações estreitas com a Ongoing, de Nuno Vasconcellos e Rafael Mora, detentora do Diário Económico.
Entretanto, através da PT, o Governo montou uma operação para comprar o grupo TVI, mandando um emissário a Espanha (Rui Pedro Soares) para tratar do negócio.
Este grupo, além da TVI, detem meios como a Lux e a Rádio Comercial.
Só fugiam ao controlo do Governo o grupo Impresa, liderado por Balsemão, e o grupo Cofina, de Paulo Fernandes.
Mesmo assim, ainda houve uma tentativa de assalto à Impresa por parte da Ongoing.
Quanto à Cofina, o Governo conhecia bem a vocação «negociante» de Paulo Fernandes e nunca recearia muitos males vindos daí.
Finalmente, José Sócrates fez uma tentativa para fechar o SOL – através precisamente do BCP, que era accionista do jornal.
O SOL era um David ao pé de vários Golias, mas irritaria Sócrates precisamente por ser um dos poucos media que ele não controlava.
E – recorde-se – foi este jornal que denunciou o caso Freeport, o caso Face Oculta (compra da TVI e tentativa de controlo de outros media) e o caso Tagusparque (apoio eleitoral de Luís Figo).
Fica claro, portanto, que houve um momento em que José Sócrates esteve mesmo à beira de dominar ou ter o apoio de importantes meios de três sectores nevrálgicos:
– Banca, com a CGD, o BPN, o BCP e o BES;
– Comunicação social, com a RTP, a RDP, o DN, a TSF, o JN e a tentativa de compra da TVI;
– Poder político, através do domínio da máquina do Governo e do aparelho do partido, onde não se ouvia uma única voz dissonante.
Só hoje, quando olhamos para essa época, percebemos até que ponto estivemos à beira do abismo.
Como foi possível permitir que se concentrasse tanto poder nas mãos de um homem psicologicamente tão instável?
E como foi possível derrubá-lo?
O que derrotou Sócrates, primeiro, foram as contas públicas – que, contrariamente aos outros sectores, ele se revelou incapaz de controlar.
Tentou até à última esticar a corda e evitar um Resgate, mas a corda acabou por partir – e isso foi a sua primeira grande derrota.
Depois foi a derrota eleitoral.
E esta constitui uma homenagem à democracia.
A democracia mostrou a sua força ao conseguir apear um homem que, à escala do país, acumulou um enorme poder «de facto».
Ele julgar-se-ia quase invencível, mas as urnas derrubaram-no.
Por isso, é muito natural que, embora afirme o contrário, hoje odeie a democracia.
P.S. – Numa entrevista publicada no fim-de-semana, Sócrates mostrou por que lhe tenho chamado «o Vale e Azevedo da política». Com uma diferença: Vale e Azevedo é mais educado.
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