terça-feira, 30 de junho de 2015
Um Papa pessimista e injusto
Miguel Angel Belloso, Diário de Notícias, 26 de Junho de 2015
Sempre considerei a fé como um motor de esperança e de alegria. Professei também uma grande admiração pelos papas João Paulo II e Bento XVI. Nenhum deles deixou de assinalar os grandes desafios que a humanidade enfrenta, mas ambos mostraram uma grande confiança no indivíduo e contemplavam o mundo com o optimismo próprio do crente. O primeiro combateu o comunismo pela destruição e morte que este tinha provocado onde foi adoptado como modelo político. Bento seguiu a esteira do seu predecessor ao considerar tacitamente o capitalismo como o sistema mais capaz de produzir o bem-estar geral apesar das suas imperfeições. Em muito pouco tempo, o Papa Francisco impulsionou uma revolução na Igreja. A sua nova encíclica, «Laudatio si», a sua carta pastoral «Evangelii gaudium», assim como as suas frequentes intervenções nos foros públicos refletem um pessimismo ontológico perturbador. Segundo Francisco, o mundo está a desmoronar-se à nossa volta sem que façamos qualquer coisa para o evitar. Os pobres são cada vez mais pobres. As desigualdades são maiores do que nunca e os bens necessários para sustentar a vida humana são cada vez mais inacessíveis. Mas estas ideias, lançadas sem o acompanhamento de um único dado, como se fossem um dogma de fé, não resistem à mais pequena análise empírica e estão completamente erradas. Se já é duvidoso do ponto de vista científico que estejamos em presença de uma mudança climática originada pelo homem, e não por circunstâncias relacionadas com a natureza do planeta, é falso que o crescimento económico aumente a degradação do meio ambiente.
Num editorial publicado no Catholic Herald Philip Booth escreve: «Como é habitual, as análises de Francisco sobre o estado económico do mundo são tremendamente pessimistas. É correcto dizer-se que a poluição origina mortes prematuras e muitos argumentam que as mudanças climáticas estão por trás dos efeitos nocivos. Mas, por outro lado, o cenário subjacente é um incremento colossal da esperança de vida e da saúde como consequência do desenvolvimento económico. E em muitas zonas do mundo, o ambiente está a melhorar espectacularmente.» Assim é: se se quiser abordar com honestidade o problema, este não reside nos países ricos mas naqueles onde não funciona a economia de mercado ou não existe liberdade nem democracia. A China, por exemplo, é dos mais contaminantes. Durante a maior parte do século XX, os Estados comunistas foram os que tiveram mais poluição e um ambiente mais degradado, enquanto os capitalistas limpavam a atmosfera de elementos tóxicos. Há solução para os problemas do meio ambiente mas esta não se encontra na ecologia, que com o pretexto de tornar-nos a vida mais agradável apoia o intervencionismo político e quer travar o progresso técnico e o desenvolvimento económico. A solução depende de que cada vez maiores partes do mundo se incorporem no mercado e se orientem para ele.
Um estudo recente do Banco Mundial indica que o número de pessoas que vivem com menos de 1,25 dólares por dia – o limiar da pobreza – diminuiu em mais de 30% desde 1981, e um relatório da Universidade de Oxford, que corrobora outro similar da ONU – pouco suspeita de ser capitalista –, confirma esta descida dramática e augura que a pobreza será completamente erradicada nos países em desenvolvimento nos próximos 20 anos se os progressos se mantiverem ao ritmo actual. A Associação Americana para o Avanço da Ciência também assinala que a esperança de vida aumentou sustentadamente desde há 200 anos, devido à diminuição das doenças cardiovasculares nos países ricos e à menor mortalidade infantil nos pobres. Se fizermos comparações estatísticas entre os países mais orientados para o mercado e os menos, comprovaremos que são os primeiros os que providenciam melhores condições aos desfavorecidos. O que melhora os níveis de vida é a industrialização e o livre comércio e não as economias dirigidas ou auto-suficientes. E são também aqueles que impulsionam as migrações das zonas rurais para as cidades, que não são os lugares sujos e desagradáveis que Charles Dickens descrevia, mas antes uma oportunidade para ganhar um salário mais alto e viver confortavelmente. Nos países emergentes, mil milhões de pessoas entrarão na incipiente classe média nas próximas duas décadas, de modo que a desigualdade global também está a diminuir. Apesar de os meios de comunicação sugerirem o contrário, o número de conflitos civis e de guerras está no ponto mais baixo da história, segundo a ONU.
Estes são os dados, mas é como se a verdade fosse uma inconveniência para Francisco e para o conjunto da esquerda. João Paulo II sempre abordou os problemas globais com foco e linguagem religiosa. Pensava que a solução para os males do mundo estava em cultivar as virtudes pessoais e em voltar o olhar para Deus. Francisco é um Papa decididamente político, um socialista convencido de que se a humanidade exibe resultados tão desastrosos é porque os seus dirigentes renunciaram ao seu papel executivo, que bem orientado daria lugar a um mundo melhor do que o governado pela força espontânea dos indivíduos actuando livremente no mercado.
Muitas das opiniões da sua última encíclica são inaceitáveis, inapropriadas ou infundadas. Engana-se quando diz que a salvação dos bancos foi feita à custa da população, pois a falência foi evitada para garantir as poupanças dos mais necessitados. A imaginária submissão da política aos poderes financeiros, às multinacionais ou à tecnocracia destila um aroma a um esquerdismo antiquado que não resiste a um único assalto: mesmo nos países mais livres e democráticos, o peso do Estado e a intervenção dos políticos na vida económica são tão perniciosos como dispensáveis. Francisco chega a ser ofensivo ao assegurar que a propriedade privada não pode estar acima do bem comum, quando é precisamente ela que o origina. Só o que se considera próprio estimula o cuidado e a atenção das pessoas para o preservar e enriquecer, quer seja uma quinta ou uma reserva de elefantes, enquanto o público, como mostra a experiência, é habitualmente pasto da negligência e do saque dos que, não se sentindo envolvidos, o maltratam e exploram por o considerarem alheio.
(…)
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