Fernando Sobral, Jornal de Negócios
A economia não é um predador inclemente. Só o é quando não a entendemos e quando fazemos dela um tubarão digno de um filme de Steven Spielberg.
Há alguns dias Manuel Alegre agarrou na lira e declamou: "Eu não sou economista e sei muito pouco de finanças, mas tenho uma outra visão da economia e não quero na Presidência da República alguém que tenha a superstição dos mercados, que aceite uma posição de subserviência em relação aos mercados, que não diga uma palavra quando o Governo toma uma atitude justa que é a de vetar um negócio que punha em causa grandes interesses nacionais".
É um poema moderno, sem rima, mas que errou no meio e no fim. No fim porque o alvo, Cavaco, já falou para apoiar o veto governamental ao negócio Vivo. E no meio porque, ao afastar do seu mundo lírico a economia, Alegre encerrou a prosa numa jaula, como se fosse um animal feroz.
A economia não é um predador inclemente. Só o é quando não a entendemos e quando fazemos dela um tubarão digno de um filme de Steven Spielberg. Alegre demonstra que não percebe o mundo: este sempre foi feito de créditos e débitos e a própria poesia está cheia desta economia de emoções.
Fazer da sua campanha uma marcha libertadora contra a economia não o levará a lado nenhum. Se olhar para a biblioteca básica da história verá como, de Marx a António Sérgio, a economia foi a poesia das consciências. A cultura nunca viveu num mundo separado da economia: lembre Alegre a Florença dos Médicis ou a Flandres da pintura. Só mais recentemente se achou que eram mundos que viviam de costas voltadas. Fernando Pessoa tinha razão quando dizia: "o poeta é um fingidor". Mas, seguindo a lógica, Alegre é um ficcionista sem noção da realidade.
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