quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

O fado português

Fernando Sobral, Jornal de Negócios

Fernando Pessoa não era um adepto militante do Fado. Mas as suas palavras ainda pesam: "O fado é o cansaço da alma forte, o olhar de desprezo de Portugal ao Deus em que creu e também o abandonou. No fado os Deuses regressam legítimos e longínquos. É esse o segredo sentido da figura de El-Rei D. Sebastião". Os portugueses sentem-se abandonados. D. Sebastião está em parte incerta. Os deuses da UE em que acreditou abandonaram-no, como mostram dia sim, dia não, os responsáveis alemães que ajudam a subir a fasquia para 7%. E sentem-se abandonados pela sua classe política. Em Portugal estamos a assistir à passagem da idade do Fado para a idade do Rock, a música dos tempos de crise, onde as energias se libertam. Por detrás da crise financeira assiste-se à implosão do sistema político, económico e social. Os grandes líderes surgem nas crises para indicar o caminho da esperança. Os nossos clamam por cortes e impostos mas não estão dispostos a dar nada em troca.

É assim que os sistemas implodem: quando já ninguém acredita na integridade de quem dirige os seus destinos. O modelo de sociedade que foi oferecido aos portugueses, o de consumo, está a ser trucidado pela crise. E nenhum outro, alternativo, está a ser oferecido a uma classe média que perece, afogada nas suas dívidas. O drama é que a classe média é a espinha dorsal dos sistemas democráticos. O seu clamor, cada vez mais audível, deveria ser escutado por uma classe política que governou para si própria. E que ainda não percebeu que os cidadãos não afogam para sempre as suas misérias no Fado.







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