sábado, 5 de fevereiro de 2011

A Força Aérea e o estado de sítio

João José Brandão Ferreira

Soubemos, por uma notícia da agência “lusa” que o Sr. Ministro da Defesa (MDN) afirmou que a Força Aérea Portuguesa (FA) “está disponível para repatriar todos os portugueses que desejem abandonar o Egipto” e que os “meios da FA estão, evidentemente, como é sua obrigação, empenhados nessa operação de repatriamento” (sublinhados nossos) e, ainda, que a “operação é tutelada pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros” (MNE) o que não se sabe muito bem o que tal quer dizer, já que o MNE não comanda qualquer força militar.

Finalmente, que “nunca as FAs faltaram às suas obrigações no que diz respeito a uma das suas missões constitucionais …”.

O que o Sr. ministro não disse é que as missões estão a ser feitas no fio da espada e que está tudo preso por arames, cada vez mais finos. E não referiu também que não lembraria a nenhum Estado-Maior, deixar partir turistas para uma área de conflito perigoso (para depois os ter que repatriar...), numa demonstração grosseira de falta de informação estratégica e, ou, capacidade de análise e decisão. Já bastaria ter que ir buscar os que lá foram apanhados desprevenidos!

E está tudo preso por fios (ou “pinças”) porque a desmontagem das capacidades militares efectuada nos últimos 25 anos, tem desmantelado de tudo um pouco e as carências em pessoal, material e financeiras são gritantes. E isto não tem nada a ver com a actual crise económico/financeira de que, aliás, as FAs são completamente alheias.

No caso em apreço a FA dispõe de seis aeronaves C-130, com cerca de 30 anos de serviço, cada vez mais difíceis de manter e a necessitar modernizações urgentes, e cuja substituição já deveria estar a ser equacionada e processada há meia dúzia de anos. A prontidão é, assim, baixa e um dos aviões destacados para esta operação foi confrontado com uma avaria em Creta.

Quanto a pessoal a situação ainda é mais crítica, já que a Esquadra só dispõe de quatro tripulações (a média dos últimos 10 anos deve rondar as quatro - ou seja é um problema crónico), quando para uma exploração adequada da frota, devia dispor de 12 (julgo que na FA ainda haverá alguns oficiais capazes de explicar ao Sr. MDN o porquê). A situação é de tal modo crítica que já se chegou ao ponto de ter um Oficial General no Estado-Maior a cumprir missões regulares na esquadra e para se cumprir o actual repatriamento, teve que se ir buscar um ex-comandante de base, a frequentar o curso de promoção a Oficial General, em Pedrouços. E tiveram que o colocar de Falcon. Vejam por quanto ficou a hora de voo…

E tudo isto porque não mais se parou de menorizar a condição militar, a partir de 1982 (fim do Conselho da Revolução e entrada em vigor da Lei da Defesa Nacional e das FAs), e de se tentar reduzir a Instituição Militar à expressão mais simples, tendendo para “zero”.

No caso particular dos pilotos (e outras especialidades críticas), a causa principal – além dos “dourados” da farda, já não terem brilho – é a disparidade pornográfica com que o mesmo patrão, isto é o Estado, trata dos seus “servidores” em termos de vencimentos e regalias sociais. No caso vertente focamo-nos nas empresas públicas de transporte aéreo, com destaque para a TAP. É impossível reter pessoal navegante, quando um co-piloto entra na TAP a ganhar o mesmo que o Chefe de Estado-Maior do Ramo, ou quando um comandante na vida civil (a quem nem sequer é exigido uma licenciatura), ganha três vezes mais do que um Coronel (ou mesmo mais), e quando os pilotos de longo curso fazem, em média, um voo, vírgula qualquer coisa (leram bem?) por mês! Isto porque em vez de terem sete tripulações por avião, têm cerca de 12, quando seis já lhes dariam uma vida confortável. Mas mesmo tendo gente a mais (ou aviões e ligações a menos), acabaram de abrir mais um concurso para pilotos que vai levar mais uns quantos oriundos da FA isto, claro, se as vagas não forem todas preenchidas por filhos de funcionários da “casa”, dadas as “tradições monárquicas” de longa data, existentes. Mas quando é preciso ir arriscar a vida e, ou, cumprir missões difíceis e arriscadas vai a FA, pois é sua “obrigação”.

A FA não tem obrigação, mas sim o dever de cumprir as missões que lhes estão consignadas, e tem-no feito com eficácia, apesar dos constrangimentos apontados. O governo é que tem a obrigação de lhe proporcionar os meios necessários e consentâneos com essas mesmas missões e prover à equidade social dos seus mais fiéis servidores. E pôr na ordem quem exorbita, ou não cumpre o que lhe é devido, ajoelhar constantemente quando o sindicato dos pilotos, vírgula, da TAP, ponto, ameaça fazer greve; ser incapaz de sanear as contas de uma companhia que desde 1974 não dá lucros e que acumulou um passivo de cerca de 2,3 biliões de euros (segundo o relatório e contas de 2009, com tendência para aumentar…) – como é que dizem que a querem privatizar?

E pagam a um estrangeiro para servir tal empresa mais de duas vezes o vencimento do presidente dos EUA. O que, incrivelmente, ou não, só foi dado conta, há uns dias, pelo directório de um partido da oposição! A TAP está tecnicamente falida e em situação ilegal, pois está com os capitais próprios negativos o que não é permitido pelo código das sociedades comerciais (art.º 35).

Não consta, porém, que toda esta situação incomode qualquer jornalista ou comentador, ou tire o sono a nenhum general ou almirante (já nem vale a pena falar em políticos…).

No fim disto tudo não se vai resolver coisa nenhuma e o abaixo-assinado é que vai passar por ser o “chato” da fita. Além de ter acabado de ganhar mais uns quantos inimigos.

1 comentário:

José Domingos disse...

Clar, que estesassuntos, não aparecem na praça pública, são CENSURADOS.
Os sindicalistas, tratam da vidinha deles, como aliás fazem os sindicalistas, cá do burgo,e, normalmente não fazem nada, a não ser sindicalizar, e são bem pagos, por isso, os jornalistas, são altifalantes, da voz do dono, para os politicos, é mais uma empresa, para colocar uns boys, e aguardar pela reforma.
É o país que merecemos.