João J. Brandão Ferreira
O Dr. Pacheco Pereira (PP) escreveu um muito
interessante artigo no Jornal «Público», de 9 de Março, com o título «Tem
sentido manter Forças Armadas em Portugal?», onde, entre vários considerandos e
exemplos pertinentes, coloca a questão central de «Portugal precisar de ter FAs
ou não».
Sendo uma questão legítima do ponto de vista
democrático, como defende, convém enquadrá-la e pôr-lhe limites sob pena de
também passar a ser legítimo (e natural?) questionarmos se a Nação Portuguesa
deve desaparecer – a velha questão de que «a Pátria não se discute mas
defende-se» – ou de passarmos a discutir se podemos levar os nossos velhos para
a montanha e abandoná-los lá (como se fez com o aborto). Se calhar o Ministério
das Finanças até aplaudia…
Podia, até, ser considerado legítimo, mas seria
moral, ou legal?
E convém lembrar que Cristo também foi
cruxificado democraticamente. De braço no ar.
Com isto dito e sem querer pôr nada mais em
causa, tenho que dizer que a questão central apontada, podendo entender-se, já
não tem razão de ser pelo simples facto de estar ultrapassada.
A questão sobre as missões e o modelo de FAs a
constituir tinha toda a razão de ser, por exemplo, a seguir ao abandono do
Ultramar e, nomeadamente, em 1982, quando as FAs se integraram plena e
normalmente, nas estruturas do Estado.
Mas tal não se fez nem nos anos seguintes em que
a pergunta era recorrente em vários meios.
A situação política e social do País, porém,
descambou e apodreceu de tal maneira que passámos a ser um Estado falido e
tutelado (e não só financeiramente) – que a inaudita posição do governo, muito
bem referida por PP, de deixar a «Troika» pronunciar-se sobre cortes nas FAs,
mais acentua – que é a própria sobrevivência de Portugal que está em causa.
Ou seja, o que faz sentido questionar é se
queremos, ainda, ter País ou não e que País pretendemos, a que a suicidária
hipótese do Federalismo Europeu está longe de ser alheia, (para já não falar no
Iberismo).
Tudo o resto está dependente desta resposta.
Quer dizer, se nós decidirmos que nos
suicidamos, a resposta relativa às FAs está automaticamente dada e, nesse caso,
nós formamos o que resta da tropa, entregamos as chaves dos quartéis e dos
paióis (vazios), a quem provar pertencer-lhe e mandamos direita volver,
destroçar.
Ou, então, revoltamo-nos pois tal, podendo não
ser nada democrático, é mais do que legitimo!...
Se por patriotismo do povo português, ou graça
da Senhora da Conceição (de Vila Viçosa), acolitada por S. Miguel (Anjo
Custódio de Portugal), a decisão fôr a de continuarmos a ter País, nesse caso
também não faz sentido, colocar a questão de precisarmos ou não de FAs, mas sim
a de estabelecer quais as missões que se entende que elas devam estar aptas a
cumprir.
A estrutura, meios, dispositivo, etc., e
recursos financeiros a alocar vêm, naturalmente, por acréscimo.
O mesmo é válido para as restantes funções
necessárias ao Estado, como expressão da Nação politicamente organizada.
Outra coisa que é necessário entender – e não se
vê referido em lado algum, mesmo em textos lúcidos como os de PP – é a de que a
hierarquia (palavra tornada maldita) das funções do Estado, existe e deve ser
tida em conta.
Isto é, o que deve vir à cabeça são as questões
de Segurança, a seguir a Justiça, finalmente as de Bem-Estar. A ordem dos
termos não é arbitrária já que não se pode ter Bem-Estar sem Justiça, e ambas
sem Segurança.
Isto que é evidente, assim não aparece aos
contemporâneos. Os políticos portugueses (idem para os ocidentais, à excepção
dos americanos, até ver) têm isto tudo baralhado.
Ofuscados que estão com o lado material da vida
e com a contagem dos votos – afinal a «democracia» depende deles – não querem
ver mais nada e acabarão por não ter coisa alguma. Como está prestes a
acontecer.
E a «arte» da política consiste, justamente, em
conseguir a harmonia entre as três áreas.
Por outro lado, a importância dos problemas não
é a mesma, nem se podem atacar todos eles ao mesmo tempo: há que estabelecer
prioridades (e, já agora, não andar a inventar problemas onde não há…).
As FAs são um pilar fundamental do Poder
Nacional e sem poder – poder efectivo, político, diplomático, económico,
financeiro, cultural, militar e psicológico – não há política possível, por não
haver qualquer capacidade de se poder escolher e manter seja que estratégia
fôr; tão pouco escolher caminhos, minimizar dependências ou estabelecer
alianças.
A Portugal apenas lhe resta poder residual e
arrasta-se por inércia.
A Instituição Militar levou quase 900 anos a
construir-se e está, em termos de conhecimento, ao nível das mais avançadas do
mundo. Mas pode desaparecer de um dia para o outro, como um fogo destrói uma
floresta.[1]
Explicar as coisas por conceitos simples, que
toda a gente perceba, ao contrário do que possa parecer, requer grande saber e
capacidade de síntese e não está ao alcance da maioria. Infelizmente tem andado
arredio da generalidade da classe política, isto para não entrarmos no campo
das (más) intenções.
Estamos a aproximar-nos – com as devidas
proporções – da sociedade que conheci na Guiné-Bissau «independente» (ah, ah,
ah!): uma manta de retalhos em que os desgraçados dos habitantes[2]
fingiam que trabalhavam e o simulacro de Estado, fingia que lhes pagava –
embora uns quantos enriquecessem.
Vislumbro sérias tribulações.
[1] Como por exemplo aconteceu, em 1807, quando
Junot dissolveu o Exército. Atente-se no custo que isso acarretou… (por exemplo
a morte de 10% da população!).
[2] E são verdadeiramente desgraçados desde que uns
díscolos de ideologias funestas os privaram, unilateralmente, da nacionalidade
portuguesa!
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