Expresso, 16 de Julho de 2013
O BPN foi, como se sabe, oferecido ao banco de Mira Amaral. Sim, 40
milhões de euros por um banco é uma oferta. E foi oferecido sem as dívidas, sem
tudo o que nele era tóxico e problemático. Isso, Passos Coelho, homem do rigor
e dos sacrifícios, deixou para os contribuintes. Para conseguir este
extraordinário montante, o Estado deu todas as garantias: o contrato assinado
com o BIC prevê que o banco se responsabilize por resolver as acções judiciais
instauradas contra o BPN por clientes e trabalhadores, mas, claro está,
mediante reembolso do Estado. A primeira factura chegou: 100 milhões de euros.
No fim o Estado pode vir a pagar ao BIC cerca de 600 milhões de euros. 15 vezes
mais do que recebeu pela privatização.
Com quase todos os que levaram o BPN à ruína em liberdade, com uma
obscura venda por trocos a um banco presidido por um ex-ministro do PSD,
deixando todos os podres para os contribuintes, o Estado continuará a financiar
cada problema que surja num banco que, na realidade, apenas geriu por dois
anos. O BPN foi assaltado pelos seus próprios donos, nós pagamos. O BPN é
privatizado, nós pagamos. O BPN continua a ter problemas por resolver, não
continuamos a pagar. Tirando a nacionalização, tudo isto é feito por um governo
que se atreve a dar lições sobre o despesismo que nos terá levado até aqui. O
problema é, ao que parece, querermos ter hospitais, escolas e reformas que não
podemos pagar.
O obscuro processo de reprivatização do BPN, um autêntico assalto ao
Estado, dirigido pelo ex-ministro das Finanças Vítor Gaspar, coordenado pela
então secretária de Estado do Tesouro, Maria Luís Albuquerque, e apoiado pelo
primeiro-ministro Passos Coelho, só podia, num país com algum respeito pelos
contribuintes, acabar na barra do tribunal. Com o julgamento dos decisores
políticos que determinaram as escandalosas condições e montantes para esta
privatização. Mas por cá, pede-se responsabilidade a todos os partidos. Que
negoceiem com esta gente a «salvação nacional». Talvez chamar o cavaquista Mira
Amaral como «personalidade de reconhecido prestígio» para moderar as conversas.
Assim ficava tudo em casa.
Este episódio, a privatização dos CTT e das Águas de Portugal, e todos
os negócios que ainda estão por fazer, são uma das razões porque tanta gente
muito respeitável da política e dos negócios não quer ondas. Não quer eleições,
oposição, contraditório. O próprio Mira Amaral disse, um dia depois da demissão
de Paulo Portas, que o Presidente da República só deveria «convocar eleições em
caso extremo», defendendo «um acordo entre os grandes partidos, PSD, PP e PS,
que sustentasse uma solução de governo». Há que manter tudo sereno, consensual,
em silêncio. Porque, como se sabe, a crise é sempre uma oportunidade. Que não venha a democracia
agitar tão paramentoso pântano.
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