João J. Brandão Ferreira
Por razões judiciais tenho feito alguma pesquisa no
arquivo do Ministério da Defesa, onde se encontra documentação muito
interessante, infelizmente ainda longe de estar toda identificada e tratada.
Encontrámos uma miríade de transcrições de emissões
de rádios estrangeiras algumas das quais possuíam programas preparados e
emitidos por «exilados» portugueses que militavam em partidos e organizações
que lutavam contra o regime político instituído em Portugal, em 1933.
Ocorreu-me que seria interessante transcrever
alguns trechos dessas emissões para os contemporâneos puderem avaliar o que
então se dizia (e as queixas e «denúncias» que se faziam) – na substância e na
forma – e poderem comparar com aquilo que se passou a seguir à «revolução» do
25/4/1974 e com o que se passa hoje em dia.
Não farei comentários deixando a cada um retirar as
suas conclusões. Vou cingir-me à «Rádio Voz da Liberdade, órgão da Frente
Patriótica de Libertação Nacional» (FPLN), que emitia a partir de Argel, entre
1964 e 1974.[1]
Eis o 1.º texto, lido em 11/9/1965, com o título
«Portugal é um País Dependente».[2]
«O terror imposto pelos monopolistas nacionais,
ligados a imperialistas estrangeiros, colocou o nosso País numa posição
humilhante de dependência perante esses mesmos estrangeiros.
O Portugal de hoje já não é nosso. É daqueles
poucos que sobre a miséria do nosso povo e de outros povos, exploram, constroem
as grandes fortunas que os tornam influentes e poderosos.
Esta é uma verdade que não receia desmentido. Esta
é uma verdade que nos propomos continuar a demonstrar. E assim falamos hoje do
sector económico que diz respeito à electricidade.
Entre nós, esta actividade básica da nossa economia
está dividida em dois grandes ramos – o da produção e da distribuição da
energia eléctrica.
Não vale a pena esquematizar, basta dizer-se que na
produção, quer hidráulica quer térmica, existem bastantes companhias ….. em
dois principais grupos com ligações entre elas – um dominado pela Companhia
Hidro-Eléctrica do Norte, e outro na dependência da Companhia de Gaz e
Electricidade de Lisboa.
A CENOF (?) controla e domina a
Companhia Eléctrica do Alentejo e do Algarve, a
Companhia Eléctrica das Beiras e a Hidro-Eléctrica do Cávado e,
ainda, a Hidro-Eléctrica de Portugal. As Companhias Reunidas de Gás
e Electricidade têm debaixo da sua alçada
a Hidro-Eléctrica do Zêzere e a Hidro-Eléctrica do Alto
Alentejo.
A Termo-Eléctrico Portuguesa está…. De muitas
outras empresas já citadas além ……
Claro que não podiam lá faltar a CENAF (?) e as
Companhias Reunidas de Gás e Electricidade. A distribuição da
energia eléctrica em Portugal foi dada em exclusivo à chamada
Companhia Nacional de Electricidade.
Neste potentado estão presentes todas as companhias
já citadas e como é evidente nestas andanças dos jogos monopolistas, lá estão
também as companhias dominantes…. E as companhias reunidas
de Gás e electricidade.
Isto equivale a dizer-se que estes dois monopólios
controlam a produção e a distribuição de energia eléctrica em todo o
país e o que é mais, ditam os preços por que essa mesma energia é vendida
aos consumidores.
Mas perguntar-se-á, são empresas independentes da
nefasta influência estrangeira?
Constituem, por acaso, uma actividade prática
daquele nacionalismo que os fascistas tanto apregoam? Ou serão antes pontas de
lança de grandes monopolistas estrangeiros mais poderosos do que eles e que
através deles exploram o povo português?
Como iremos ver, de nacionalistas nada têm. O que
de resto está de acordo com a política antinacional do governo que eles
defendem e sustentam no poder. Governo de traição à Pátria.
Vejamos pois o que é a CENOF (?). É um centro de
monopolistas em Portugal e que através do Banco Português do Atlântico está
ligado à ….. (nomes de vários bancos estrangeiros que não foi possível
identificar).
Quando as Companhias Reunidas de Gás
e Electricidade estão ligados a….(mais nomes de bancos estrangeiros).
Isto é uma pequena amostra…..(falha).
Esta uma das razões que explica o facto de terem
sido construídas barragens e terem aumentado os preços do quilovátio. Por outro
lado, como os monopolistas pretendem recuperar o mais possível os capitais
investidos, esta também é uma das causas do elevado preço do custo do consumo
de energia eléctrica no nosso País.
O programa da FPLN prevê a nacionalização de todos
esses sectores básicos da economia nacional. Esse é o caminho seguro para uma
verdadeira independência de Portugal. E se presentemente somos dependentes, por
traição do fascismo, a revolução que temos que fazer é uma revolução
democrática e nacional.
Democrática porque é antifascista. Nacional porque
é anti-imperialista.
Portugueses, uni-vos em luta contra o fascismo.
Uni-vos na luta por uma verdadeira independência nacional.
Portugal para os portugueses. Portugal para os
portugueses.»
Manuel Alegre |
Piteira Santos |
Tito de Morais |
[1] Recorda-se
que a Argélia tinha ascendido à independência, em 1962, depois de uma longa e
cruenta guerra com a França. A Argélia tinha um regime político de partido
único de inspiração marxista, cujo 1.º presidente foi Ben Bella. Assumia-se
como um país do «Terceiro Mundo» vindo, mais tarde, a situar-se na órbita da
extinta URSS. A FPLN tinha lá o seu «quartel- general», desde 1962 e o
principal apoio. Na FPLN pontuavam Piteira Santos, Tito de Morais e Manuel
Alegre. A «Rádio Voz da Liberdade» era um dos seus principais instrumentos e os
dois principais (únicos?) locutores eram Manuel Alegre e Estela Piteira Santos.
[2] Fundo
5/23/79/12, do Arquivo MDN.
NOSSO COMENTÁRIO:
Neste filme, onde é que
entrarão a «antimonopolista» EDP, a «democrática» taxa audiovisual, o
«desinteressado» Mexia e os «nacionais» chineses?
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