sexta-feira, 13 de novembro de 2015


O PS caiu na ratoeira


José António Saraiva, Sol, 11 de Novembro de 2015

Ao fim de cinco semanas de penosas negociações, a esquerda está exactamente no ponto em que estava no dia 5 de Outubro: o PCP e o BE comprometem-se a viabilizar um Governo do PS, mas não se comprometem com mais nada.

A trajectória destas cinco semanas permite antever o inferno que serão os tempos que aí vêm. Se durante o namoro já houve tantas dificuldades, o que será depois do casamento?

De facto:

Os três partidos, PS, PCP e BE (não falo de Os Verdes) não conseguiram chegar a um acordo comum, nem se sentaram uma só vez à mesma mesa;

Os três partidos não conseguiram chegar a uma moção de rejeição comum, antes apresentaram três;

– Os três partidos não chegaram a um programa de Governo comum, antes disseram que não rejeitarão o programa de Governo que o PS apresentar (que contempla abundantes cedências ao PCP e ao BE);

– Os três partidos não se aplaudiram uns aos outros nos discursos parlamentares, e mesmo no discurso do presumível futuro líder do Governo de esquerda houve uns que aplaudiram de pé e outros sentados;

– Os três partidos não se entenderam, sequer, para que as assinaturas dos acordos fossem públicas, e tudo se passou furtivamente num gabinete fechado.

Alguém pode acreditar numa coisa assim, feita de forma envergonhada e às escondidas?

A esquerda festiva celebra esta aliança «histórica».

Percebo que o PCP e o BE celebrem. De facto, a partir do momento em que o Governo seja viabilizado, o PCP e o BE, que tinham pouca relevância parlamentar, passam a ser os partidos mais importantes do Parlamento: a queda do Governo depende de qualquer um deles. O Governo passa a estar dependente de cada um deles. O Governo torna-se refém de ambos ao mesmo tempo.

Para o PCP e o BE, era importantíssimo que o PS «mordesse o queijo» e caísse na ratoeira. Só a partir do momento em que o PS decidisse formar Governo, sem exigir a presença nele dos líderes do PCP e do BE, estes ficariam com as mãos livres para fazer o que quisessem.

Depois da entrada em funções, António Costa vai ter de negociar medida a medida, lei a lei, com o PCP e o BE. Eles aceitarão o que quiserem e rejeitarão o que quiserem. O Governo estará amarrado de pés e mãos e não poderá fazer nada.

Mesmo para o primeiro Orçamento vai ser necessário negociar tudo: porque o PCP e o BE recusaram-se a dar carta branca a António Costa, se comprometeram a aprovar esse Orçamento inicial.

O PS caiu na ratoeira. O PCP e o BE têm a partir de agora a palavra.

Perguntar-se-á: e Cavaco Silva? Não tem nada a dizer?

Penso que não pode fazer muito. Manter um Governo de gestão será impossível, um Governo de iniciativa presidencial também seria chumbado, e adiar muito uma solução não resolve nada.





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