Ana Cristina Marques, Observador, 27 de Fevereiro de 2016
Ana Rita Cavaco, bastonária da Ordem dos Enfermeiros, revelou num programa de rádio que já assistiu a casos de eutanásia nos hospitais públicos. «Eu não estou a chocar ninguém.»
A eutanásia já é praticada nos hospitais públicos. Quem o disse foi Ana Rita Cavaco, bastonária da Ordem dos Enfermeiros, durante o programa Em Nome da Lei, emitido na rádio Renascença. A responsável pela Ordem dos Enfermeiros admitiu ter conhecimento de casos em que médicos sugeriram administrar insulina a doentes terminais, de maneira a provocar-lhes o coma e, consequentemente, a morte.
«Vivi situações pessoalmente, não preciso de ir buscar outros exemplos, em que houve médicos que sugeriram, por exemplo, administrar insulina àqueles doentes para lhes provocar um coma insulínico», revelou Ana Rita Cavaco.
Perante esta declaração, a jornalista confrontou a bastonária, questionando-a sobre se as situações descritas aconteceram, ou não, no Sistema Nacional de Saúde. «Sim, como é óbvio», responde Ana Rita Cavaco. «Eu não estou a chocar ninguém, porque quem nos está a ouvir e trabalha no SNS sabe que estas coisas acontecem por debaixo do pano. Portanto, vamos falar abertamente sobre isto», continuou.
Ana Rita Cavaco, bastonária da Ordem dos Enfermeiros |
A responsável pelos enfermeiros alegou que não é a única pessoa a afirmá-lo publicamente. «Há mais figuras públicas que o admitiram. Acho que vale a pena admitirmos que há coisas que, enquanto sociedade, não estão legalizadas ou legisladas e que, portanto, escondemos.»
Ana Rita Cavaco está entre as pessoas que já assinaram a petição Direito a Morrer com Dignidade, divulgada no início de Fevereiro. Da lista de signatários destacam-se, entre artistas, cientistas e políticos, a ex-ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, e o antigo presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Rio.
«A Morte Assistida é um direito do doente que sofre e a quem não resta outra alternativa, por ele tida como aceitável ou digna, para pôr termo ao seu sofrimento. É um último recurso, uma última liberdade, um último pedido que não se pode recusar a quem se sabe estar condenado. Nestas circunstâncias, a Morte Assistida é um acto compassivo e de beneficência», lê-se na respectiva petição.
Do outro lado da barricada está a médica e deputada do CDS Isabel Galriça Neto que, no mesmo programa de rádio emitido pela Renascença, argumentou que a eutanásia não é um tratamento ou um assunto médico:
«Isto não é um tratamento médico. Isto não é um assunto médico, não é. Os médicos servem para ajudar a viver. Outro equívoco que não podemos ter é a ideia de que a eutanásia acaba com o sofrimento. A eutanásia acaba com a vida, ponto final parágrafo».
Galriça Neto defende que ainda que o manifesto faz uso de um «eufemismo perigosíssimo», uma vez que «diz acabar com a vida de pessoas com uma doença incurável e em sofrimento profundo», algo que a deputada não considera ser igual a dizer que essas pessoas «estão no fim da sua vida».
Já o padre Vítor Feytor Pinto, também convidado do programa, disse que o manifesto assenta num «erro terrivelmente ilusório» ao chamar morte assistida à eutanásia.
«A morte digna é a morte assistida. Assistida com cuidados eficazes, com a companhia da família, com a terapia de compaixão indispensável, com os apoios religiosos a que todo o doente tem direito na religião que pratica. Tudo isso é que é a morte assistida. Não é a precipitação da morte», conclui.
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