João J.
Brandão Ferreira
«Nem
tudo o que é legal é moral».
Retirado
do «senso comum»
Correndo o
risco de ir escrever relativamente a uma questão sobre a qual já se disse tudo,
tanto no campo da análise séria, como no âmbito do anedotário nacional –
estamos a referir-nos ao tristíssimo e inqualificável caso da licenciatura do
Sr. Ministro (temporário) Relvas – vamos, mesmo assim, arriscar uns comentários
que temos por relevantes.
No meio
desta lamentável saga, que escancara sem pudicícia as fragilidades humanas e as
do sistema político em vigor, tem sido posta a tónica no cidadão Miguel – que
num regime civilizado não teria, provavelmente, passado de arrumador de
cadeiras – ao ponto de o tornarem no bombo da festa em quem qualquer um
desopila as raivas que a actual crise exponencia.
Ora, em
abono da verdade, o desacreditado membro do governo, que ainda lambe as feridas
de outra incrível trapalhada que teve como epicentro uma mistura explosiva de
“espiões”, aparentes solidariedades maçónicas, negócios e conflito com
jornalistas é, neste caso, consequência e não causa.
E é
consequência de uma coisa de que pouca gente tem falado, ou seja o “Processo de
Bolonha” e a sua implementação em Portugal.
É preciso
que se diga que o dito processo, independentemente das boas intenções – se é
que alguma – destina-se a nivelar por baixo, facilitar o reconhecimento
académico entre estados, embelezar as estatísticas e promover a fluidez do
emprego de um país para outro.
Não sendo
evidente, o pano de fundo de tudo isto, é o de facilitar o amalgamento dos
povos dos países europeus de modo a acabar com as nações e facilitar o
“federalismo”.
Foi, então,
por esta via que foi introduzido o sistema de atribuição de créditos à
experiência profissional de um cidadão de modo a facilitar-lhe a aquisição de
um grau académico. Estes créditos dão, automaticamente, equivalência a cadeiras
ou partes de cadeiras, relativas a uma determinada licenciatura.
As
minudências que regulam todo este processo estão consignadas em lei.
Ora quando o
Governo Português, por alturas de 2005, entendeu avançar com a adopção do
Processo de Bolonha, teve que preparar uma lei do ensino superior, para tal.
Esta incumbência calhou ao Ministro da Ciência e Tecnologia, Mariano Gago (um
ex - maoista reconvertido).
Os
procedimentos legais impunham, todavia, que a proposta de lei fosse submetida
ao “Conselho Nacional da Educação”[2] , de que
fazem parte, hoje em dia, 68 personalidades com competência em vários saberes ligados
à educação.
Na altura,
dos “conselheiros” que votaram apenas um votou favoravelmente o projecto
de lei (parecer 4/2005, de 1/06). O Sr. Ministro irritou-se, ignorou a votação
e terá mimoseado o Conselho, com fraseologia pouco delicada.
Na sequência,
os conselheiros apresentaram, cada um, o pedido de demissão, aos quais o
governante – lembrando-se, certamente, dos pensamentos de Maozedong – não se
dignou despachar por mais de dois anos.
E aqui é que
parece estar o verdadeiro busílis do ocorrido, apesar do comentador, Professor
Marcelo, o ter entendido branquear na sua última homilia domingueira,
chamando-lhe “normal”.
Ora, salvo
melhor opinião, tudo isto representa a inversão da lógica das boas práticas. Ou
seja, até agora, cada um de nós estudava para arranjar um grau académico para
poder exercer uma profissão; daqui para a frente vamos tentar encontrar um
qualquer trabalho para conseguir um grau académico…
Deixando uma
porta aberta para uma valorização pessoal tardia que a prática de uma reconhecida
boa actividade profissional, em determinadas “escolas da vida”, penso haver
alguma justiça na atribuição de créditos, tendo o cuidado de objectivar
processos, compatibilizando matérias e aferindo provas. E tudo isto apenas
feito por excepção e não ser encarado como mais um “negócio” possível.
E recorda-se
que para casos ilustres já existe a figura do “Doutoramento Honoris Causa”.
Ora a cereja
em cima do bolo, no caso vertente, resulta de que, aparentemente, nem sequer as
regras em vigor para a atribuição da turbo – licenciatura ao,” em busca do
conhecimento Relvas”, foram cumpridas (pareceres, conselho cientifico, lógica
dos créditos, etc.). Na prédica referida, Rebelo de Sousa ainda lhes fez saber
(aos responsáveis da universidade), o que estes tinham de fazer, mas aqueles
não ouviram ou já não foram a tempo de actuar antes da investigação
jornalística.
Passando-se
as coisas assim, é lícito que se levantem as maiores suspeitas sobre eventuais
cambalachos, os mais diversos.
A
Universidade ficou sob suspeita – e o visado ministro já descartou a
responsabilidade de qualquer ilegalidade, para cima dela – os alunos estão
incomodados (e com razão) e, tudo junto, estamos perante mais uma machadada no
já muito desacreditado ensino nacional, que anda, há décadas, juntamente com o
sistema de Justiça cá do burgo, em competição para ver quem consegue fazer pior
que o outro.
E, na base
de tudo isto, está a complacência extrema, dos diferentes extratos da
sociedade, para com as imoralidades várias que diariamente são vertidas perante
os olhos, ouvidos e narizes de todos, e a venalidade do sistema e actores
políticos, que não se sabem preservar a si próprios, começando por nem sequer
fazerem nenhuma triagem/exigir formação, a todo e qualquer candidato a
político.
Castigá-los
apenas pelo voto é uma falácia que não resiste à mais elementar análise.
[1] Assim se pronunciou o ex
- Magnifico Reitor da Universidade Lusófona, Santos Neves…
[2] Lembra-se que este é um Conselho importante, cujo presidente é eleito
pela Assembleia da República
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