António Delicado, Jornal Sol, 9 de
Setembro de 2015
Parafraseando Beccaria, um importante pensador
do século XVIII, o combate à impunidade não deve basear-se tanto na dureza das
penas mas na certeza da aplicação das mesmas, ainda que sejam moderadas. Isso
será mais eficaz na prevenção do crime do que o temor de uma pena mais severa,
quando a mesma se encontra associada a uma esperança razoável de impunidade.
É assim com a criminalidade comum e é talvez
ainda mais assim com a criminalidade de colarinho branco, nomeadamente a
corrupção. E, quanto mais rápida for a aplicação da sanção, mais justa, útil e
eficaz será.
No século XIV, mais precisamente em 1360, foi
assinado o primeiro tratado de extradição português. Celebraram-no o rei D.
Pedro I de Portugal e o rei D. Pedro I de Castela, visando Portugal obter nessa
altura a extradição dos dois assassinos de D. Inês de Castro.
A extradição é um instrumento que responde a uma
evolução histórica e a uma apurada necessidade humana de concretização da
justiça criminal num plano internacional, sendo também um instrumento em
constante evolução.
Foi o que aconteceu nos planos nacional e
europeu, onde obteve importantes reconfigurações em tempos recentes. Giscard
d’Estaing, no Conselho Europeu de Bruxelas de 1977, tentou impulsionar a
criação de um espaço jurídico europeu, tendo proposto, nomeadamente, a celebração
de um tratado tendo em vista uma extradição automática, uma ideia que baseou
também a adopção do agora já célebre mandado de detenção europeu (MDE).
Este passo significou um salto de gigante no
espaço europeu, em especial pelo seu impacto sério na efectiva realização da
justiça, apesar de a sua concretização se ter registado apenas com o 11 de
setembro de 2001.
O facto de o MDE ser considerado a joia da coroa
da justiça criminal europeia baseia-se precisamente na noção de que se trata de
um instrumento que respondeu ao conjunto de necessidades apresentado pelo seu
tempo.
Também por isso nos parece que temos base
suficiente para que nos empenhemos, enquanto País e enquanto Europa, na efectiva
implementação das soluções que vimos aprovando ao longo dos últimos anos e na
concretização das soluções visadas nos Tratados, como é o caso da Procuradoria
Europeia, que o Tratado de Lisboa estabeleceu que pode ser criada,
nomeadamente, para combater as infracções lesivas dos interesses financeiros da
União Europeia.
A Procuradoria Europeia poderá consistir num dos
melhores investimentos que, num quadro de apreciação de custo/benefício,
poderemos fazer, uma vez que está em causa a protecção de centenas de
milhões de euros do orçamento da União Europeia face a fenómenos de fraude,
corrupção e outras infracções, que colocam também em perigo o Estado de
direito, a confiança dos cidadãos nas instituições e o desenvolvimento
económico e social.
A Procuradoria Europeia, para além do seu
significado político e institucional, permitirá uma intervenção mais assertiva
no combate ao crime financeiro internacional e a outra criminalidade
organizada. Consiste numa resposta que se exige para os tempos de hoje,
nomeadamente pelo potencial de aumento de controlo e de diminuição das esperanças
de impunidade. Eliminemos estes espaços e façamos justiça.
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