terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Os espaços estratégicos de interesse nacional (2)


João José Brandão Ferreira










A Sociedade Portuguesa de 1974 ao Presente

«Uma Nação que confia em seus direitos, em vez de confiar em seus soldados, engana-se a si mesma e prepara a sua própria queda.»
Rui Barbosa

Em termos sociais e políticos a Revolução que se seguiu ao golpe de estado ocorrido em 25 de Abril de 1974, foi como se o paredão de uma grande albufeira tivesse explodido: a água jorrou fora, em catadupas invadindo as margens de uma forma anárquica.

Quando, muito a custo, após 25 de Novembro de 1975, se conseguiu voltar a colocar a água (isto é, o povo e os políticos) dentro do leito do rio – uma sociedade organizada em Estado/Nação – decretou-se oficial e oficiosamente, que o dito leito não voltaria a ter margens ou tendo-as, seriam muito flexíveis. E quanto a “barragens” estávamos conversados, eram passado e negro.

Foi a época de grandes mudanças comportamentais, de querer experimentar tudo e de tudo ser posto em causa.

As convenções sociais quase ruíram, as instituições nacionais foram seriamente abaladas, a disciplina social anarquizou-se.

A estrutura familiar, o ensino e a vida nas empresas foram sacudidas por uma agitação avassaladora. Ruíram conceitos e preconceitos e o que era bom ontem, passou a mau hoje. Ficou tudo baralhado de referências.

A situação mais gravosa que adveio – se assim se pode qualificar – foi a tábua rasa que se fez da hierarquia: a hierarquia na política, nas FAs, nos órgãos do Estado, nas empresas, nas escolas, na família. Falhada a tentativa de, sobre estes escombros, instalar um regime totalitário, ficámos assim.Ora a hierarquia é fundamental para manter uma disciplina e originar uma ordem. É um requisito para haver autoridade. Ficámos, pois, sem autoridade, ou seja sem a capacidade de poder decidir e de implementar decisões sobre todo o largo espectro da vida nacional.

As leis que se fizeram espelharam toda esta situação, e ainda espelham.

Toda a gente achou, a começar nas forças políticas que despontaram um pouco por todo o lado, cujas mensagens eram ampliadas extraordinariamente pelos “media”, que o futuro seria cor-de-rosa e que todos os cidadãos tinham direito a ser bafejados com essa cor. Daqui nasceu a “ditadura” dos direitos sobre os deveres, o que também ficou consagrado nas leis, desde Constituição da República ao Código Penal, dos Regulamentos das Escolas ao Código do Trabalho. Restou apenas uma excepção: os regulamentos militares mas, à custa de muita insistência lá os conseguiram, também, esfarelar.

Nem os seminários escaparam…

A pouco e pouco (levou cerca de 10 anos), a situação foi normalizando, os excessos mais extremos foram burilados e os diferentes sectores da sociedade foram-se adaptando às mudanças ocorridas. A demagogia da luta política/partidária manteve, sem embargo, o excessivo predomínio dos direitos sobre os deveres, o laxismo na instrução e no aparelho judicial e a conflitualidade nas relações de trabalho.

Acabou-se com o serviço militar obrigatório (um erro trágico) e com qualquer espírito de serviço à Nação. O único dever que restou foi o de pagar impostos!

Por outro lado deixaram de fazer escola, um conjunto de preceitos morais, como honradez, lealdade, solidariedade, esforço, poupança, probidade, prudência, etc., que eram enformadores da sociedade.

A boa educação degradou-se e o esbatimento da «censura» social desregulou e desbragou a vida do dia-a-dia.

Tudo isto aumentou os níveis de insegurança, criminalidade e falta de vergonha.

O atraso no desenvolvimento do interior do país, e a atracção do litoral, despovoou os campos e as aldeias, ao passo que se criou nas cinturas das grandes cidades – sobretudo Lisboa e Porto, mas também, em Braga, Leiria, Setúbal, Coimbra e outras - uma população sub urbana algo desenraizada e com problemas próprios. Os conflitos gerados nos Palop’s após a independência, a pobreza em largos espaços da terra e o facto de os portugueses passarem a recusar exercer determinadas actividades profissionais, levaram à vinda para Portugal de várias centenas de milhares de emigrantes.

A situação social voltou a agravar-se há cerca de 10 anos com o aparecimento em força de «temas fracturantes» e também com o ataque à religião cristã, nomeadamente aos católicos, num esquecimento imprudente dos erros da Primeira República.

Em síntese, podemos afirmar que vivemos uma tentativa de implantação de uma «ditadura ideológica e de costumes», misto de jacobinismo serôdio da Revolução Francesa e de ideias derivadas (e actualizadas!) do Maio de 68, em França, cuja disseminação é propalada pela maioria dos órgãos de comunicação social (com aumento exponencial a partir das emissões dos canais de televisão privados).

Em tudo isto abunda o relativismo moral, que virou as referências e o «norte» de pernas para o ar; a Teoria do «Bom Selvagem» inventada há mais de 200 anos pelo genebrino Rousseau, que tem levado a uma desresponsabilização colectiva, e a ideia de não colocar todos os «ovos no mesmo cesto», o que estilhaçou a autoridade e a capacidade de se obterem resultantes na vida individual e colectiva. Em complemento fomentou-se um individualismo, egoísmo e hedonismo feroz, centrando-se a vida da sociedade e a própria existência, no «eu». E, claro, de propaganda avassaladora relativa a consumismo.

Hoje vive-se a correr. Não há tempo para reflectir, nem para abarcar e digerir a complexidade de tudo. O materialismo domina o espírito.

Não é só a economia e as finanças que se pretendem globais. A informação já o é, e verte sobre todos nós dilúvios de notícias. Tudo condiciona tudo.

É uma sociedade neste estádio, de que apenas tentámos dar um retrato breve, em que todos teremos de obrar o futuro e as estratégias que se conseguirem delinear. Sem entender isto e ter tudo isto por base, não se obterá sucesso em nada.

A crise económica e financeira internacional, que se estará a abater sobre nós, actualmente no seu clímax, vai obrigar a repensar toda a nossa maneira de ser e estar.

Há sempre males que vêm por bem.

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